Imagem ilustrativa.| Foto: Pedro Serapio/Gazeta do Povo
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O meio ambiente sustenta a vida e degradá-lo compromete o nosso futuro – nada mais óbvio. Ademais, o bem-estar que nossos filhos e netos terão ou não, daqui a 20 ou 50 anos, depende diretamente de como tratamos o planeta hoje. “A Terra não nos pertence. Ela foi emprestada de nossos filhos” – faz-se oportuno um cacique indígena norte-americano, em frase proferida há mais de um século.

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O ser humano se autoproclama inteligente, mas na verdade é insensato e paradoxal, para não dizer estúpido, por contaminar a água que bebe, o ar que respira e o solo do qual obtém alimentos, por destruir de forma desmesurada as florestas, as plantas e os animais. Um estudo do Fundo Mundial para a Natureza (WWF) estima que foram ultrapassados em muito os limites de exploração que o planeta pode suportar sem ser degradado. A Terra já não mais nos aguenta. Para voltar ao equilíbrio precisaríamos de 1,5 Terra. É a marcha da insensatez do ser humano consumista, utilitarista, predador.

E a Mãe Natureza sabe ser pedagógica, pois a um só tempo é agradecida e dadivosa com quem a trata bem, e em contrapartida é incisiva e veemente na reação quando agredida. Eventos meteorológicos extremos, como inundações, secas, incêndios, tufões, furacões, são exemplos eloquentes de catástrofes naturais e o incremento deles no decurso das últimas décadas, como consequência da ação humana, é incontestável.

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Os desastres naturais custaram à economia mundial quase US$ 3 trilhões entre 1998 e 2017, conforme publicação da ONU em colaboração com a Universidade Católica de Louvain, na Bélgica. No Brasil, as perdas chegaram a US$ 15,7 bilhões no mesmo período. O estudo demonstra ainda que o número de pessoas afetadas e que necessitaram de algum tipo de ajuda emergencial chega perto dos 4,4 bilhões, seja por mortes, seja por ferimentos ou falta de abrigo.

De 1970 a 2019 (50 anos cheios), a população mundial mais que dobrou, de 3,7 bilhões para 7,8 bilhões. Na mesma proporção, a emissão de CO2 (dióxido de carbono) no mesmo período partiu de 15 bilhões de toneladas para 34 bilhões, fruto do uso de combustíveis fósseis e processos industriais. Desse total, coube ao Brasil, no mesmo período, a emissão de 2,18 bilhões de toneladas deste gás, ocupando assim o quinto lugar no mundo, atrás de China, EUA, Índia e Rússia.

Segundo a Organização Meteorológica Mundial, a última década foi a mais quente da qual se tem registro. Em consequência, o Brasil está secando. Nos últimos 35 anos, o país perdeu 16% da superfície de água e as queimadas atingiram 20% do território nacional, conforme relatório do MapBiomas. Os reservatórios de nossas usinas hidrelétricas estão no menor nível histórico. Com efeito, uma nova bandeira tarifária, chamada “escassez hídrica”, precisou ser criada, pois nem a bandeira vermelha está mais dando conta dos custos da energia mais cara devido ao acionamento das custosas e poluentes termelétricas.

Semelhantemente, os sinais agônicos de nossos rios justificam o neologismo “hidrocídio”. Em um dos biomas de maior diversidade do mundo – a Mata Atlântica –, restam apenas 7,3% da cobertura original. Constatam-se terras estorricadas por secas e queimadas cada vez mais severas aqui e em todo o mundo. “Quando a Terra já estiver desertificada é que o ser humano vai aprender que não se come dinheiro” – faz-se oportuna a escritora Rose Marie Muraro.

Os mares estão ficando mais ácidos. A alteração do pH se deve ao excesso de gás carbônico, afetando a produção de micro-organismos e plânctons que estão na base da cadeia alimentar de muitos seres vivos dos ecossistemas marinhos. Ademais, há o progressivo degelo dos glaciares e a elevação do mar em 20 centímetros desde 1900.

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Kilimanjaro, o monte mais alto da África, deve perder totalmente a cobertura de gelo até 2030, em processo acelerado de derretimento nas últimas décadas. É irônico, pois, na língua nativa da Tanzânia, o verbete kilimanjaro significa “o monte das neves eternas”. Aquele povo primitivo só não imaginava que o ser humano contemporâneo – que se autoproclama civilizado – pudesse subverter os sagrados ditames do tênue equilíbrio ambiental.

A bem da verdade, o planeta não poderá ser salvo apenas pelos governos ou ONGs, ou pela nossa comiseração e discursos nas mídias sociais, mas pelas ações concretas de cada um de nós. Não basta condoer-se com o desmatamento da Floresta Amazônica, com a morte dos ursos polares, com a extinção do mico-leão-dourado. É preciso que deixemos de vislumbrar o aquecimento global como uma hipótese teórica e a sustentabilidade como um mero discurso politicamente correto. É preciso que pratiquemos o básico, como a destinação correta do lixo, o uso responsável e comedido da água e da energia elétrica.  É preciso que cada um de nós esteja disposto a arcar com um produto mais caro, mas que é produzindo respeitando o ambiente, em detrimento do mais barato, porém não biodegradável. Em não o fazendo, vamos nos autoproclamar Homo stupidus em vez de Homo sapiens.

Jacir J. Venturi, autor de livros, vice-presidente do Conselho de Educação do Paraná, foi diretor de escola e professor de ensino fundamental, ensino médio e pré-vestibular.