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Se na atual conjuntura o otimismo continuar impul­­­sionando outras fontes de financiamento, novas medidas anti-inflacionárias devem ser adotadas

O desempenho expansionista da economia brasileira nos últimos três trimestres vem sendo puxado, em grande medida, pelo forte crescimento da demanda interna: consumo das famílias, gastos do governo e investimento das empresas. Fato esse que se justifica, principalmente pelas medidas de estímulo ao consumo, implementadas no período mais crítico da crise financeira internacional. Com isso, o país neste ano obteve vários indicadores econômicos conjunturais favoráveis, por exemplo, a baixa taxa de desemprego, o aumento na produção industrial e o otimismo dos empresários em relação ao futuro da economia. Esse último fator, aliado à facilidade de crédito, podem gerar situações de desequilíbrios, tais como estamos vivenciando atualmente. Na verdade, o crédito representa a "materialização" desse otimismo, que move a economia para períodos de expansão. E seu excesso gerará pressões inflacionárias.

Para se ter uma noção de como o otimismo está afetando o comportamento dos agentes econômicos, destaca-se que o estoque total das operações de crédito (livres e direcionados) do sistema financeiro totalizou R$ 1.583 bilhões em agosto de 2010, elevando-se 19,2% em doze meses, passando a representar 46,2% do PIB. As operações de crédito com recursos direcionados totalizaram um montante de R$ 541,2 bilhões em agosto, crescendo a uma taxa de 29,6% em 12 meses, alavancada principalmente pelo crédito habitacional e do BNDES que expandiram a uma taxa anualizada de 51,1% e 32,3%, respectivamente. Esses fatores, aliados à elevação do crédito livre para as famílias e empresas de 14,5% e mais de 50% para veículos entre setembro de 2009 a agosto de 2010, ocasionaram um excesso de demanda por bens e serviços, o qual está pressionando fortemente os principais índices de inflação. O IGP-M anualizado passou de 5,79% em julho desse ano para 10,27% em novembro e o IPCA de 4,60% em julho para 5,20% em outubro. Não podemos esquecer que a meta de inflação, para esse último índice, é de 4,5% ao ano.

Ou seja, o atual ritmo de expansão de crédito na economia brasileira é incompatível com um crescimento sustentável (não inflacionário). Para esse tipo de situação o Banco Central (BC) deve atuar de forma ativa e eficaz para garantir a estabilidade da moeda. A ação inicial do BC e do Conselho Monetário Nacional foi mexer de forma inteligente nas regras do compulsório. Com isso, as instituições financeiras terão menos recursos para realizar suas operações de crédito. Por exemplo, para empréstimos com prazo superior a 24 meses haverá restrição de recursos, além da incidência da alíquota maior. Consequentemente, consumidores dispostos a adquirirem um automóvel terão que disponibilizar um valor de entrada maior.

O aumento na alíquota do compulsório ocasionará também um aumento na taxa de juros para os financiamentos de médio e longo prazo, encarecendo o crédito bancário. Entretanto, os efeitos reais para economia das mudanças no compulsório ainda são incertos e uma análise detalhada sobre os índices de confiança e volume de crédito devem ser prioridades no governo. Essas incertezas surgem em virtude da atuação dos bancos privados na concessão de novos créditos. No período severo da crise financeira em 2008, o BC liberou cerca de R$ 100 bilhões do compulsório e a concessão de crédito, nos meses seguintes, não sofreu expansão, em virtude do pessimismo generalizado dos agentes privados. Isto é, se na atual conjuntura o otimismo continuar impulsionando outras fontes de financiamento, novas medidas anti-inflacionárias devem ser adotadas para ajustar o crescimento da demanda interna com a capacidade de geração de produtos.

Pode-se argumentar resumidamente que as economias capitalistas financeiras são guiadas em geral por dois tipos de ondas. Uma delas de otimismos e expansão do crédito e outra de pessimismo conjugando escassez de liquidez. Calibrar as expectativas dos agentes econômicos para um crescimento sustentável, através do controle de crédito e da taxa de juros, é o maior desafio dos bancos centrais.

Lucas Lautert Dezordi é professor de Economia da FAE.

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