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Dias atrás, surgiu mais um ingrediente à já tão conturbada crise política brasileira: o pacto – intermediado pelo ex-presidente Lula, tudo leva a crer – entre o presidente da Câmara dos Deputados e a presidente da República, para que aquele não dê curso a eventuais pedidos de impeachment em troca de que os partidos que dão sustentação à outra votem contrariamente a qualquer cassação do mandato dele.

Nada mais autodestruidor do que estabelecer este tipo de acordo. Porque simplesmente se esquecem os dois interessados de que há uma dependência externa e mercurial de um sem-número de variáveis cujo controle, por mais carisma que tenham seus idealizadores, beira o impossível.

Nem a teoria dos jogos ajuda o objetivo de ambos: safarem-se de responsabilidades. O presidente da Câmara não resiste à avalanche de fatos e notícias sobre o seu envolvimento na Operação Lava Jato, porque ele e as rampas do Congresso Nacional e do Palácio do Planalto sabem: os seus pares, quando pressentirem que a própria carreira politica está em perigo, abandonam quaisquer apoios: é um salve-se quem puder, ainda mais que o paroquialismo tão caro a deputados e senadores será submetido à prova nas eleições de 2016.

Dilma e Cunha se ajustaram na expectativa de que conseguirão submeter terceiros aos seus objetivos

Na outra ponta, a presidente permanecerá refém do presidente da Câmara, que age sem destemor, sempre que assim o entender e for do seu interesse pessoal, para atingi-la. As recentes decisões provisórias de ministros do STF não afastam seu poder de dar curso ao processo de impeachment: só o impedem de adotar as regras que foram inovadoras em relação ao que a lei contempla. Acrescente-se a isso o risco do que vier a decidir tanto o Tribunal Superior Eleitoral, no que tange à impugnação de mandato, quanto o Tribunal de Contas da União, agora sobre as “pedaladas fiscais” que continuaram em 2015.

Na verdade, ambos se ajustaram na expectativa de que conseguirão submeter terceiros aos seus objetivos. É ato de desespero ou de soberba, que leva inevitavelmente à mútua destruição, ora porque não há mais alternativa (desespero), ora porque desdenha da capacidade, lucidez e reação de outras instituições e da própria cidadania (soberba).

Por fim, restam, no campo das emoções, a tristeza e o constrangimento pelo fato de que personagens tão importantes para a vida nacional, que conquistaram mandatos pelo voto, sejam capazes de acertos que só visam o seu projeto pessoal de poder.

Derocy Giacomo Cirillo da Silva é procurador da República aposentado.
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