| Foto: Pixabay
Ouça este conteúdo

A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) deu um grande passo, em 2021, ao modificar o processo de submissão de procedimentos para o rol de cobertura dos planos de saúde. Antes, o processo tinha de respeitar uma janela de submissões que se abria a cada dois anos. Ou seja, um tratamento com potencial para mitigar sintomas ou até salvar vidas poderia ter de aguardar o período de dois anos para ser avaliado e incorporado na lista de coberturas obrigatórias. Agora, a submissão de uma tecnologia registrada na Anvisa pode ser feita a qualquer tempo, e ela poderá ser imediatamente integrada à lista de cobertura dos planos de saúde, desde que atenda aos critérios técnico-econômicos de avaliação pela ANS.

CARREGANDO :)

Um dos efeitos claros da pandemia foi tornar mais evidentes as fraquezas no setor de saúde, não só em termos de investimento, mas de estrutura. Uma das consequências claras foi o atraso na realização de procedimentos eletivos, adiados tanto por falta de capacidade dos hospitais quanto por receio dos pacientes por causa da Covid-19. Alguns procedimentos, neste momento, já passaram da categoria de eletivos para emergenciais. Do lado dos pacientes, esses adiamentos poderão trazer complicações graves e o impacto disso só deverá ser quantificado nos próximos anos. Já do lado do sistema de saúde como um todo, espera-se uma elevação de custos como consequência de complicações e agravamento de quadros, além de filas para realização de procedimentos.

Em meio a essa tempestade dos últimos dois anos, no entanto, alguns progressos puderam ser vistos e merecem ser elogiados, como o esforço da Anvisa para avaliar a eficácia de vacinas e medicamentos para a Covid-19 em tempo recorde, com a transparência e a seriedade que o trabalho de uma agência regulatória requer. Paralelo a isso, a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec) teve uma demanda alta e não prevista de avaliação de tecnologias e diretrizes para a Covid-19, como foram com os equipamentos para uso de oxigênio, intubação e ventilação mecânica, tratamentos medicamentosos e vacinas, entre outros. Talvez por essa razão a tão esperada trombectomia mecânica – uma das mais avançadas terapias para tratar pacientes vítimas de acidente vascular cerebral isquêmico – tenha tido sua incorporação no SUS atrasada em relação ao cronograma original da Conitec, e ainda não esteja disponível aos pacientes. A trombectomia mecânica tem eficácia comprovada na redução de sequelas, e é a única modalidade não medicamentosa de tratamento disponível no Brasil. A previsão mais otimista é de que esteja disponível na rede pública neste semestre.

Publicidade

A pandemia também fez com que a saúde ganhasse espaço nos debates e nas agendas da sociedade como um todo. Nunca se falou tanto em medicina quanto atualmente, e isso é uma vitória para o setor. Mas, além do cenário desafiador provocado pela Covid-19, que sacudiu o setor do dia para a noite, o mercado ainda teve de lidar com um planejamento anual incerto. Para aqueles que realizam transações a partir do estado de São Paulo, por exemplo, houve o forte impacto da retirada da isenção do ICMS no estado ao longo de 2021, ação que só foi revertida pelo governo paulista a partir de janeiro deste ano. E, mais recentemente, o setor foi surpreendido com a Portaria 3.693/2021, que reviu a tabela SUS para alguns procedimentos cardiovasculares, provocando a redução dos valores de reembolso do setor público. A reflexão aqui não é criticar ou apoiar, mas ilustrar alguns dos entraves no longo período pandêmico que já perdura um pouco mais de dois anos.

Estou otimista, por outro lado, com o avanço das discussões e com a conscientização do mercado, que se mostra cada vez mais aberto à avaliação de medidas que contribuam para a sustentabilidade do setor. A pandemia antecipou e fomentou debates importantes nesse sentido. Embora seja triste saber que o avanço foi impulsionado por uma crise que deixou mais de 620 mil mortos no Brasil, não podemos deixar de olhar a metade cheia do copo. Talvez esse seja o caminho para uma saúde mais digna para a população nas próximas décadas, e de uma maior capacidade para lidar com cenários de crise.

Igor Zanetti é diretor de Acesso e Assuntos Corporativos da Medtronic Brasil.