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Esta coluna, com frequência, criticou o governo da presidente Dilma Rousseff, sobretudo por seu alinhamento ideológico com governos autoritários e com ditaduras que amordaçam as liberdades e espancam os direitos humanos. A adesão cada vez mais explícita ao projeto bolivariano de socialização continental, marca registrada do governo petista, está comprometendo gravemente o peso do Brasil no cenário mundial e arranhando o prestígio do Itamaraty. Mas a honestidade intelectual e o dever de isenção, pré-requisitos de quem pretende fazer jornalismo ético, me obrigam a reconhecer quando o governo acerta. É o caso da Medida Provisória 657/2014, que confere maior autonomia e independência à Polícia Federal.

Para entender a importância da iniciativa, seria oportuno que, juntos, façamos a leitura da MP. Muita gente aplaude ou condena iniciativas em razão direta de suas simpatias políticas ou preferências ideológicas. E não é por aí. É necessário ir à fonte, ao documento original.

São três os pontos que merecem destaque: o posto de diretor-geral da Polícia Federal passa a ser ocupado apenas por delegado de Polícia Federal de carreira, dentre os integrantes do mais alto nível desse cargo; passa a haver participação da OAB nas fases do concurso público para o cargo de delegado de Polícia Federal; e passa a haver exigência de três anos de atividade jurídica ou policial para a posse no cargo de delegado de Polícia Federal.

A iniciativa confere maior autonomia e independência à PF, pois seu chefe passa a ser, necessariamente, alguém oriundo dos quadros técnicos, que foi aprovado em concurso e que já trilhou todos os níveis do cargo. Ou seja, indicações meramente políticas deixam de ser viáveis. A nomeação pela Presidência da República do delegado-geral não acarreta por si só uma intervenção na atividade policial. O mesmo já ocorre com outras carreiras, como os ministros do STF, o procurador-geral da República e o advogado-geral da União.

A participação da OAB no concurso público representa uma saudável vigilância da sociedade civil organizada sobre um dos concursos mais concorridos, o que contribui para uma PF cada vez mais independente, republicana, técnica e transparente. A exigência de experiência jurídica ou policial para o ingresso no cargo de delegado sobressai como uma evolução do que já acontece em diversos outros cargos. Valoriza-se ainda a atividade policial dos outros cargos ao se reconhecer esse tempo de experiência como um requisito para a posse no cargo de delegado federal.

A MP nada mais é que um detalhamento normativo do que já existe na Constituição de 1988 e reforça a independência da Polícia Federal. Isso é muito importante.

O escândalo da Petrobras, um autêntico enredo de novela de bordel, tem seu lado positivo: a força irreprimível da investigação e dos fatos. A PF tem feito um excelente trabalho. O MP tem contribuído enormemente na luta contra os predadores do interesse público. O Poder Judiciário, na pessoa do competente e corajoso juiz federal Sergio Fernando Moro, está respondendo adequadamente ao clamor da opinião pública. A imprensa, independentemente de alguns excessos, está cumprindo o seu papel. Sucessivas matérias, desnudando autênticas redes de corrupção instaladas no coração dos poderes da República, têm desencadeado uma onda de decência. Reforçar as instituições, sua independência e transparência, é o melhor caminho de defesa da democracia. A Medida Provisória 657/2014 cumpre esse papel.

Carlos Alberto Di Franco, doutor em Comunicação pela Universidade de Navarra, é diretor do Departamento de Comunicação do Instituto Internacional de Ciências Sociais (Iics).

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