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Quem são os 6 ministros que Bolsonaro escolheu na reforma ministerial
Esplanada dos ministérios em Brasília.| Foto: Ana Volpe/Agência Senado

Não me lembro de quantas vezes diversas pessoas, analistas e jornalistas falaram sobre os riscos de um golpe de Estado no Brasil da Nova República, seja durante os governos de esquerda, seja durante os de direita. Sempre achei algo muito fantasioso quando muitas vezes lia reportagens recheadas de ilações sobre políticos, forças armadas, entidades transnacionais, grandes corporações da mídia e outros agentes que estariam conspirando contra a nossa ainda jovem democracia. Exporei o porquê de tal aventura ser inviável, seja para aqueles saudosos da ditadura militar da década de 60, seja para aqueles que têm um fetiche pelos governos ditatoriais de Cuba e da Venezuela.

Hipoteticamente, se o governo federal realizasse um golpe tomando o controle dos estados e das capitais federais, ou não respeitando o resultado eleitoral e mantendo um candidato derrotado no poder, o primeiro fato que ocorreria seria o não reconhecimento do governo daquele momento em diante, principalmente por parte dos Estados Unidos e da União Europeia. Sob o ponto de vista internacional, essa seria uma deslegitimação de toda e qualquer decisão nacional.

Sob o ponto de vista econômico, estaríamos excluídos do Mercosul devido à cláusula democrática, o que afetaria fortemente nossa indústria nacional. As operações de swap com bancos centrais como o BCE e o Fed seriam cortadas, deixando-nos vulneráveis em situações de crise como vimos em 2008 e em 2020. Por mais “heroico” que possa ser para alguns tresloucados, um golpe de Estado elevaria o dólar para R$ 10, forçando o Banco Central a vender quantidades absurdas de reservas ou a limitar a conversão de divisa estrangeira. Seja como for, seria o fim dos investimentos no Brasil, sejam eles na bolsa ou na economia real. Ato contínuo, o BC elevaria os juros para patamares de dois dígitos a fim de conter a saída de investidores – sem muito sucesso, mas colocando a economia nacional de joelhos sob o ponto de vista de investimentos internos e tomada de crédito. A bolsa derreteria e nossas empresas perderiam bilhões de reais em valor de mercado.

Que situação mais perfeita haveria para uma corrida aos bancos para retiradas de dinheiro do que um golpe de Estado? Obviamente começaríamos a assistir à quebra de bancos, limitações de saques e um estresse no sistema financeiro nacional, o que cortaria a linha de crédito das empresas, colocando o setor varejista e o comércio em uma situação de penúria.

Neste contexto, a instabilidade de contratos, dado que a Constituição de 1988 não teria mais validade, seria mais um dos fatores de desestabilização nacional; em pouco tempo operações comerciais, aluguéis e contratos entre empresas e pessoas teriam pouca validade e dificilmente seriam cumpridos, pois não existiria regra superior em vigência que os colocasse em prática.

Em poucas semanas a inflação chegaria a galope e o governo federal seria forçado a adotar o “antigo remédio” da indexação e da correção monetária, jogando-nos em um abismo de difícil volta e enterrando de vez o Plano Real e o tripé macroeconômico. Voltaríamos à década de 1970, tudo por causa de pessoas que não têm o mínimo apreço pela democracia e bajulam os autocratas, à esquerda ou à direita.

Muitas das nossas exportações seriam boicotadas por causa do golpe de Estado, ou mesmo por haver apenas um pretexto protecionista. Não importa a causa, isso derrubaria nossa balança comercial e nos jogaria ao longo de meses em uma nova crise cambial, forçando a desvalorização da moeda para fechar a balança comercial, o que resultaria em mais inflação.

Em poucos meses o índice de pobreza extrema chegaria aos dois dígitos, e a massa de desempregados estaria marchando nas ruas. Estudantes e a classe média se juntariam por meio das redes sociais, e o governo assistiria incrédulo às capitais sendo tomadas por pessoas que viram sua vida ser destruída em prol de algo que fatalmente seria um desastre.

Em poucas semanas, as revoltas internas tomariam corpo, ganhariam visibilidade internacional e seriam apoiadas pelas maiores democracias do planeta, causando não apenas a queda dos líderes do governo, mas também a prisão de seus principais artífices.

Em um Brasil interconectado globalmente, membro do G20 e maior economia de mercado da América Latina, não há espaço para a manutenção de golpes de Estado ou governos ilegítimos. Essa seria uma aventura com pouco prazo de validade e dificilmente iríamos nos recompor na mesma década. Escrevo este texto com o intuito de mostrar como a dominância econômica se impõe sobre a política, seja ela democrática ou não, e como o nosso Brasil não aguentaria um novo golpe de Estado.

Em minha opinião, aqueles que idolatram o regime militar ou o governo de Cuba, e pensam em adotar ideias semelhantes para o Brasil do século 21, não têm espaço no pensamento democrático de hoje e só contribuem para o caos e a desinformação.

Igor Macedo de Lucena, economista e empresário, é doutorando em Relações Internacionais na Universidade de Lisboa, e membro da Chatham House – The Royal Institute of International Affairs e da Associação Portuguesa de Ciência Política.

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