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Mobilidade urbana
Atrair o usuário para o transporte coletivo, compartilhar veículos e descarbonizar: premissas da mobilidade do futuro colocam gestores públicos e empresas no rumo da inovação tecnológica.| Foto: Divulgação/Minsait

Aumentar a quantidade de usuários do transporte público pode contribuir com melhorias no trânsito. Isso porque quanto mais acessível, maior qualidade e abrangência do sistema de transporte coletivo, menor é a quantidade de veículos, contribuindo com qualidade ambiental e segurança nos deslocamentos. O alto custo da tarifa, os ônibus lotados, a demora e insegurança nos pontos de embarque são parte de um sistema de mobilidade que, em vez de garantir deslocamento digno, reduz a renda dos mais pobres e expulsa usuários para outros modais: transporte por aplicativos, uso de bicicleta e, em muitos casos, para o deslocamento a pé.

Em Curitiba, por exemplo, entre 2017 e 2022, a rede integrada de transporte perdeu aproximadamente 300 mil passageiros em sua média diária de usuários. Parte dessa queda é explicada pela pandemia. Mas a recuperação tem sido lenta. Um dos motivos dessa condição é o alto custo da tarifa que afeta a recuperação econômica das famílias.

Nem toda “cidade inteligente” é justa e democrática, mas para projetar uma cidade democrática com justiça social é preciso muita inteligência colaborativa

A tarifa elevada limita a capacidade de busca de oportunidades, compromete a circulação para o trabalho, lazer, cultura e esporte, além de restringir o acesso a mercados e serviços públicos. A cidade é subaproveitada e os direitos sociais e econômicos são negados cotidianamente. Reduzir esse custo pode significar melhores condições materiais e a distribuição de despesas, por exemplo, na alimentação das famílias. Transporte caro contribui para fome e insegurança alimentar.

Para enfrentar as condições atuais é preciso que o sistema de transporte contribua para um processo sustentável e includente de desenvolvimento no qual as cidades combinem as dimensões econômica, política e urbanística. No aspecto econômico, democratizar benefícios e responsabilidades pelo custo do sistema de transporte com a revisão de fórmulas e critérios que resultam na tarifa técnica dever ser base para contratos de concessão, com transparência em custos e subsídios. Para que o custo da “tarifa social” de acesso ao sistema, cobrada na catraca, seja reduzido ou até zerado, é necessária uma análise que extrapola o transporte como um circuito fechado. É uma análise orientada por um projeto de cidade, com uma gestão integrada de esforços, com resultados na economia e indicadores sociais.

Também é necessário democratizar conhecimento e processos decisórios: base para uma gestão progressista e redistributiva. Não é o sistema de transporte que precisa evoluir, mas o sistema de gestão da cidade, em especial os ritos de decisão que combinam mobilidade urbana e demais políticas públicas. Enquanto o sistema perde qualidade, perde passageiros pagantes, empresas do setor continuam lucrando e recebendo benefícios com recursos públicos e acesso facilitado a crédito. As informações disponíveis para estudos e controle social são insuficientes.

A terceira dimensão é a democratização urbanística, que combina regras de uso e acesso ao território. Sem uma política democrática do solo urbano com produção de moradias dignas e com valor acessível, próximas aos principais eixos transporte público, as cidades entram num ciclo de precarização e desigualdade. O tecido urbano torna todo sistema mais caro e o custo de vida mais alto. O tal tripé – uso do solo, que inclui habitação digna, transporte e vias – precisa ir além de um discurso e imagem em apresentações oficiais.

A cidade precisa combinar democracia, inteligência e inclusão. Curitiba pode aproveitar sua inteligência ao estimular processos colaborativos e democráticos e repensar a política de mobilidade. A história de Curitiba é reconhecida por inovar no transporte, entretanto, tende a parar no tempo/espaço como uma simples e lenta linha verde (os moradores do Atuba vão entender).

Hoje, os rankings de cidade celebrados tratam de uma suposta inteligência, traduzida em tecnologia e comunicação. A inovação para um trânsito seguro e inteligente tem sido atropelada por negócios que vendem soluções para um metaverso. Para atender necessidades concretas, desenvolver métodos que contemplem eficiência, diálogo e respeito com a coisa pública também requer inteligência. Nem toda “cidade inteligente” é justa e democrática, mas para projetar uma cidade democrática com justiça social é preciso muita inteligência colaborativa, diálogo democrático e transparência com o orçamento e contratos públicos.

Alexandre Pedrozo, arquiteto urbanista, professor da FAE Centro Universitário nas áreas de Planejamento Urbano e Regional, Política Habitacional e Regularização Fundiária, é integrante da Divisão de Informações Estratégicas do Departamento de Planejamento e Gestão do Ministério Público do Paraná (MPPR).

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