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René Dotti.
René Dotti.| Foto: Sylvio Sirangelo/Arquivo TRF4

De um sonho nascemos. Do maior de todos – o amor. Peregrinos, sonhadores, tecemos nossa fantasia, vestimos nossa vocação, acontecemos! E, se na arte do sonho, a vida é feliz ilusão, sonhar e amar hão de ser sempre inspiração.” (Ana Maria Posatto)

Quando é a capacidade de sonhar e de amar que nos inspira, é fácil lembrar como o professor René Ariel Dotti foi generoso com a vida e com quem teve a oportunidade de ter contato com ele. Amou sua família, seus amigos e seus alunos de diferentes gerações em 40 anos de magistério na Faculdade de Direito da UFPR. Amou a liberdade e a humanidade. Peregrinou pelo direito, sonhou e difundiu a cultura. Teceu nossa fantasia por um mundo mais justo. Dosava, como ninguém, a lhaneza no trato com a firmeza necessária na luta pela liberdade, seja em tempos de ditadura, seja no tempo que for. Soube dar sentido à “dignidade da beca”, como usou escrever numa de suas crônicas de domingo. E vestiu suas vocações. Ator, escritor, professor, secretário de Estado da Cultura e advogado, René Dotti foi – e seguirá sendo – boa inspiração.

Testemunhei a generosidade de suas aulas que não se resumiam ao direito penal e ao processo. Homem de cultura inigualável, transitava, com uma facilidade rara, pela história, pela filosofia e pela sociologia, numa riqueza de detalhamento e com uma didática e clareza de exposição que conduziam a plateia, sem nenhum exagero, a se aproximar do sentido grego do “symposium” de Platão. Aos jovens alunos de então se dirigia dizendo comporem “um mural feito com a argila do presente e o cinzel da esperança”. Com esse espírito aprendi com ele muito do que tento passar hoje em sala de aula.

Contribuiu para aprimorar a legislação penal brasileira e era incansável na escrita e na difusão da cultura. Publicou inúmeros livros, crônicas e artigos. De sua produção como jurista, na acepção vera do termo, merecem destaques sua famosa tese de cátedra, “Base e Alternativas para o Sistema de Penas”, suas anotações de Casos Criminais Célebres, seu pitoresco Breviário Forense, coletânea de seus escritos semanais no saudoso caderno “Direito e Justiça”, e seu Curso de Direito Penal, na 7.ª edição. Sempre à frente dos debates relevantes do momento, o professor René ultimamente o fazia, também, através de seu “Blog do Dotti”, onde divulgava suas “Crônicas do Exílio”, com críticas importantes do cotidiano político, jurídico e cultural.

O Paraná deve um lugar de honra nos anais de sua história a um de seus mais ilustres filhos, que soube peregrinar, amar e nos fazer sonhar com uma sociedade mais justa, livre e solidária.

E, se “nenhum homem é uma ilha”, como anotou o poeta inglês John Donne, não será o isolamento (de “isola”, ilha) do atual momento o vírus capaz de nos distanciar do continente de bons valores transmitido pelo professor René. Esses permanecem, compartilhados pelos seus queridos familiares, e pelo sem-número de amigos e alunos que hoje recordam, emocionados, os bons momentos e as boas lições de vida. Nós, peregrinos e sonhadores, seguiremos tecendo nossa fantasia, inspirados em René Ariel Dotti, sem nos perguntar por quem os sinos dobram. Eles dobram por ti, Professor.

Rodrigo Chemim, doutor em Direito, é professor do mestrado em Direito da Universidade Positivo. 

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