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Em países como Estados Unidos e Inglaterra a índole do criminoso, tenha a idade que tiver, e sua consciência a respeito da gravidade do ato que cometeu é que são levados em consideração

Todos devem se lembrar de Roberto Aparecido Alves Cardoso, o Champinha, que, no final de 2003, aos 16 anos de idade, torturou e matou o jovem Felipe Caffé, de 19 anos, e a adolescente de 16, Liana Friedenbach, enquanto o casal acampava em área isolada de uma cidade do interior de São Paulo. Perícia e depoimento de Champinha revelaram que o jovem Felipe foi morto com tiro na nuca, depois de ser torturado, e que Liana teria sido levada até um matagal, onde foi estuprada e morta com golpes na cabeça. Apesar da crueldade, Champinha não respondeu pelos crimes porque era menor de idade, fato que resgatou debates sobre a maioridade penal no Brasil.

Para o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), sequestro, tortura, reiterados estupros e homicídio são considerados atos infracionais de natureza grave, e não crimes. A legislação brasileira sobre a maioridade penal entende que o menor deve receber tratamento diferenciado daquele aplicado ao adulto. Estabelece que o menor de 18 anos não possui desenvolvimento mental completo para compreender o caráter ilícito de seus atos. Adota o sistema biológico, em que é considerada somente a idade do jovem, independentemente de sua capacidade psíquica. Em países como Estados Unidos e Inglaterra não existe idade mínima para a aplicação de penas. Naqueles países, a índole do criminoso, tenha a idade que tiver, e sua consciência a respeito da gravidade do ato que cometeu é que são levados em consideração. Em Portugal e na Argentina, o jovem atinge a maioridade penal aos 16 anos. Na Alemanha aos 14 anos e, na Índia, aos 7.

Nossa Constituição Federal promulgada há 23 anos, em 1988, prevê a responsabilização criminal aos 18 anos de idade, ou seja, antes dessa idade o menor não comete nenhum tipo de crime, mas ato infracional, regulados pelo ECA. No atual modelo brasileiro, o menor cumpre um máximo de três anos de internamento e ao atingir a maioridade penal todos os atos infracionais, inclusive homicídios, tráfico de drogas e estupros, são "apagados" de seus registros, não sendo considerados, de nenhuma forma, para qualquer tipo de agravante, seja quando cometer crimes ou para embasar pedido de prisão. Um incentivo ao recrutamento de menores para o cometimento de condutas ilícitas.

Afinal, qual é o novo modelo que estamos propondo? Baseado em três premissas obrigatórias para o sucesso da alteração legal, a responsabilidade criminal seria fixada a partir dos 16 anos da seguinte forma: responderiam pelos crimes previstos no Código Penal e leis esparsas somente mediante avaliação criminológica a ser realizada por peritos em psicologia e psiquiatria forense, que atestem que a pessoa tem condições de entender o caráter ilícito de sua conduta; passariam a existir Casas de Custódia exclusivas para a faixa dos 16 aos 24 anos de idade, isolando-os de criminosos profissionais, com investimentos e estrutura especial para obtenção da ressocialização com foco na cidadania, profissionalização com cursos técnicos, tratamento da dependência química e acompanhamento familiar; criaríamos um crime autônomo, enquadrado como hediondo, para os criminosos que recrutem ou utilizem menores de 16 anos em ações criminosas, com cumprimento de pena integralmente em regime fechado e sem direito à liberdade provisória e/ou fiança. O assunto é muito polêmico, mas é um debate necessário.

Será que um novo modelo de maioridade penal no Brasil teria poupado a vida de Maria Benigna Martinelli de Oliveira, pró-reitora da Universidade Federal do Paraná, executada friamente por um menor, em 2008, dentro de sua casa, em Curitiba? Ou a do menino João Hélio, de 5 anos de idade, que, em 2007, foi arrastado quilômetros pelo Rio de Janeiro em um carro roubado por marginais, um deles menor de idade? Não há como afirmar. Mas tenho certeza de que as leis são criadas para resguardar a convivência pacífica em sociedade, definindo o que são condutas ilícitas e prevendo sanções para, finalmente, proteger a grande maioria de seus cidadãos.

Entendo que a Constituição Federal não é um fim em si, deve ser reformulada para se adaptar às novas realidades sociais. Precisamos de um novo modelo criminal de responsabilização e ressocialização para nossos jovens, do contrário, tornar-se-ão criminosos violentos vitimando inocentes.

Fernando Francischini, deputado federal (PSDB-PR), é delegado da Polícia Federal licenciado.

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