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Rodrigo Cunha, presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), repugna com veemência soviética o projeto do Estatuto da Família: “É quase um nazismo querer impor ao outro aquela sua convicção particular religiosa”, disse em entrevista ao blog de Kennedy Alencar. A deputada Erika Kokay (PT-DF) conseguiu, numa única frase, impingir toda uma série de classificações demeritórias ao PL 6.583/13: “O parecer é uma construção de profunda homofobia, de falta de sensibilidade. É uma tentativa desesperada do segmento fundamentalista de construir uma peça para se contrapor ao Supremo Tribunal Federal”.

Nazista. Homofóbica. Fundamentalista. Todas aquelas portentosas palavras soltas, ditas quando não se tem o que dizer. Encerra-se o debate destruindo-se moralmente o opositor. Todo mundo sabe que o Estatuto da Família é “nazista e homofóbico”; ninguém sabe o que o Estatuto da Família realmente diz. E, apesar desse espernear, poucos projetos de lei foram tão criticados mais por adjetivos vazios do que por argumentos reais.

É preciso mudar, é preciso atender às vontades deles, aos desejos deles – não aos do povo, que escreveu a Constituição

Defendendo um conceito mais amplo de família

A busca pela definição de família a que temos assistido na sociedade brasileira se dá num clima político bastante controvertido e causa estranhamento e desconforto para muitos setores.

Leia o artigo de Mário Antonio Sanches, professor da PUCPR.

De fato, a raiva de Cunha e da deputada Erika não é dirigida ao PL, mas à Constituição. Eles não admitem viver num país em que a Constituição tem um capítulo, o VII, cujo título começa com “Da Família”. Inconcebível: Rodrigo Cunha e Erika Kokay querem “famílias”, no plural, para o nobre objetivo de acolher homossexuais e tutti quanti – o presidente do IBDFAM disse mesmo que “a família não é mais singular, é plural”. Não na Constituição brasileira.

E se o artigo 226, mesmo assim, continua dizendo no singular que “A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”, eles insistem: não, não e não. Não aceitam essa Constituição. Pior ainda se um projeto de lei simplesmente, e de forma literal, a repete: inadmissível. O PL 6.583/13 fez isto nos seus artigos 1.º a 3.º. É nazismo. E, quando o mesmo artigo 226, §3.º, afirma que a família – no singular – “é reconhecida como a união estável entre o homem e a mulher”, é caso de infarto fulminante. Não se pode conviver com essa Constituição – não essa aí. Não este povo soberano: não este. É preciso mudar, é preciso atender às vontades deles, aos desejos deles – não aos do povo, que escreveu a Constituição.

E isso se faz convencendo 11 cabeças iluminadas no STF – 11, e apenas 11 – a alterar a Constituição sem perguntar a absolutamente nenhum integrante do povo se alguém queria a mudança.

Agora que o Estatuto da Família apenas repete o artigo 226 da Constituição, vem Rodrigo Cunha dizer que a lei “já nasce inconstitucional” (mas como, se repete a Constituição?) e que é nazista (então a Constituição também o é?), e a deputada Erika Kokay brada que é “uma ofensa ao STF” – esquecendo-se, ou talvez ignorando, que, segundo o §2.º do artigo 102 da Constituição, o único poder que não se vincula às declarações de inconstitucionalidade do STF é, vejam só, o Legislativo. A deputada Erika Kokay não quer que o Legislativo exerça seu papel constitucional.

E assim chegamos ao dia em que uma lei é “inconstitucional” por simplesmente repetir a Constituição; mais um passo e a própria Constituição se tornará inconstitucional por não dizer o que eles querem. A isso se chama Estado autoritário: é o oposto de um Estado constitucional.

Taiguara Fernandes de Sousa é advogado e jornalista.
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