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Revogação da reforma trabalhista desperdiçará avanços processuais e trará insegurança jurídica
| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Muito tem se falado no meio político a respeito da necessidade de se revogar a Lei 13.467/2017, popularmente chamada de “Reforma Trabalhista”, uma vez que ela não teria atingido o seu fim principal, qual seja, gerar empregos no país. Tal premissa, não bastasse falaciosa, não reflete o real escopo da Lei 13.467/2017.

Mais do que modernizar as relações de trabalho, a citada norma trouxe implicações importantíssimas no processo do trabalho: 1. regulamentou os requisitos da reclamação trabalhista; 2. instituiu novas regras de distribuição do ônus da prova; 3. detalhou pressupostos recursais para recursos de natureza extraordinária para o Tribunal Superior do Trabalho; 4. normatizou a exceção de incompetência territorial; 5. passou a prever as causas de litigância de má-fé; 6. estabeleceu o incidente de desconsideração de personalidade jurídica; 7. alterou critérios de concessão de Justiça gratuita; 8. passou a prever honorários advocatícios sucumbenciais etc.

De igual sorte, no âmbito do direito coletivo a reforma passou a extinguir a obrigatoriedade da contribuição sindical, valorizou o princípio do negociado sobre o legislado e, ainda por cima, regulamentou o artigo 11 da Constituição da República, o qual prevê a representatividade dos trabalhadores no local de trabalho.

Não fosse isso, no âmbito do direito individual a Lei 13.467/2017 foi a responsável por: 1. regulamentar o teletrabalho – tão utilizado durante o período da pandemia de Covid-19; 2. estabelecer a prescrição intercorrente dentro do processo trabalhista; 3. acabar com as horas in itinere; 4. regulamentar o banco de horas e jornadas especiais de trabalho; 4. possibilitar o fracionamento de férias em três períodos; 5. estabelecer critérios para fixação de danos morais; 6. redefinir a natureza jurídica de prêmio e outras verbas pagas em decorrência do contrato de trabalho; 7. revogar a exigência de homologação da rescisão contratual no sindicato da categoria; 8. criar uma modalidade de dispensa – a dispensa por mútuo acordo entre as partes – etc.

Concatenando as alterações citadas acima e o relatório que foi apresentado pelo deputado Rogério Marinho na Câmara Federal, conclui-se que a argumentação de que a reforma foi aprovada precipuamente com o objetivo reduzir o número de desempregados não encontra sustentáculo. O objetivo central das alterações trazidas pela reforma foi o de modernizar o processo e as relações de trabalho, como, aliás bem destacado pelo relator:

a necessidade de trazer as leis trabalhistas para o mundo real, sem esquecer dos seus direitos básicos e das suas conquistas históricas que, por sua importância, estão inseridos no artigo 7.º da Constituição da República. Precisamos evoluir, precisamos nos igualar ao mundo em que os empregados podem executar as suas atividades sem que estejam, necessariamente, no estabelecimento; em que a informatização faz com que um empregado na China interaja com a sua empresa no Brasil em tempo real; um mundo em que se pode, e se deve, conferir maior poder de atuação às representações sindicais de trabalhadores e de empregadores para decidirem, de comum acordo, qual a melhor solução para as partes em momentos determinados e específicos.

O objetivo central das alterações trazidas pela reforma foi o de modernizar o processo e as relações de trabalho

Pensando além do mundo político, é impossível não notar que a Lei 13.467/2017 trouxe impactos significativos dentro do Direito e do Processo do Trabalho, sendo responsável por atualizar procedimentos processuais e por regulamentar questões individuais e coletivas que eram inexistentes e/ou diferentes quando da consolidação das leis trabalhistas em 1943.

A revogação completa de uma norma que foi recentemente aprovada pelo Congresso Nacional e que trouxe mudanças sistêmicas no processo e nas relações individuais e coletivas de trabalho trará insegurança jurídica ao país – dado que diversos procedimentos que foram adaptados em 2017 teriam de ser readequados novamente – e colocará em xeque a credibilidade das instituições brasileiras. Defender a revogação da reforma de forma indistinta mostra-se irresponsável e contrário aos interesses do Brasil.

Gabriel Henrique Santoro é advogado e professor universitário.

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