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Houve um tempo em que os portugueses eram os donos do Brasil. Com o desenvolvimento e a democracia, os brasileiros começaram a se sentir os donos do país. Pura ilusão. O conjunto dos brasileiros não são os donos do Brasil, porque o país está dividido entre os grupos que o compõem. Um exemplo é a ânsia dos consumidores atuais para queimarmos o mais rapidamente possível todo o petróleo disponível sob o solo brasileiro; e a disputa entre Petrobras, estados e municípios para se apropriarem dos lucros decorrentes dessa exploração.

É como se a República brasileira fosse dividida entre cada segmento da sociedade atual, e entre os brasileiros de hoje e os de amanhã. Como se o Brasil fosse cheio de donos. Talvez a maior deformação na apropriação do Brasil seja a maneira pela qual a atual geração se apropria dos nossos recursos, depredando-os sem nenhuma consideração pelas gerações futuras. O que foi feito com o ouro, nos séculos 17 e 18, estamos fazendo agora com a água – poluindo os rios –, com a renda nacional – consumindo-a no presente, em vez de poupá-la –, com o petróleo e seus royalties – queimados e gastos em atividades que não deixarão resultados permanentes.

O Brasil chegou ao século 21 repartido em grupos, sem um sentimento geral, sem visão de longo prazo nem patriotismo.

Isso dificulta o enfrentamento de todos os outros problemas. Cada Unidade da Federação defende seu interesse específico e cada governo quer gastar todo dinheiro no imediatismo do seu mandato: na hora de tomar decisões, as futuras gerações brasileiras não existem.

Quando, há 50 anos, defendíamos que "Petróleo é Nosso", a ideia era reparti-lo entre os brasileiros daquele tempo, cada um se apropriando da maior parcela possível. O certo teria sido dizer "O petróleo é do futuro, das crianças do Brasil". Se pensássemos assim, não estaríamos discutindo qual estado ou município deve receber mais royalties, e sim como investi-los para construir um Brasil melhor. Fosse essa a postura adotada, e todos os recursos iriam para cada criança, vinculados ao investimento na educação, cada município e estado recebendo proporcionalmente ao número de crianças na escola.

É com esse intuito que o senador Tasso Jereissati e eu apresentamos projetos de lei que, sem mudar a distribuição das atuais reservas de petróleo entre estados e municípios, vinculam os recursos decorrentes das novas reservas em investimentos na Educação de Base. Esses projetos foram transformados em emenda ao projeto original enviado pelo governo, atualmente em tramitação no Congresso. A grande diferença é que, em vez de distribuir os royalties do petróleo entre unidades federativas, o Brasil vai distribuí-los entre a geração atual e as futuras. A atual ficaria com o direito de consumir o petróleo, queimando-o para transformá-lo em energia, mas pagaria um royalty às gerações vindouras, investindo na construção do futuro, por meio da boa educação para toda a população.

Esse investimento, aplicando os royalties proporcionalmente ao número de crianças do município e do estado e vinculando-os à educação, é a forma de transformar o petróleo – um recurso esgotável – em riqueza permanente – a inteligência do Brasil.

Se não agir assim, e se as reservas do pré-sal se confirmarem, o Brasil corre o risco de cair na maldição do petróleo: pobreza ao redor da riqueza, inflação nas áreas de produção e, sobretudo, o baque do seu esgotamento. Em vez disso, o petróleo do pré-sal precisa servir ao futuro do Brasil.

Cristovam Buarque, professor da Universidade de Brasília, é senador pelo PDT/DF

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