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Passa-se a conceber um modelo que con­­­duza o em­­presariado a contribuir para a minimização das carências de políticas públicas

A Constituição Federal em seu artigo 170 consagra as diretrizes que devem nortear o desenvolvimento da atividade econômica no país. Dentre eles, destaca-se a menção à função social da propriedade empresarial.

O sistema econômico nacional deve se estruturar de forma a compatibilizar a busca do lucro, vocação da atividade empresarial, e os benefícios que essa atividade deve trazer para a coletividade.

Ao lado do exercício empresarial, os serviços públicos também têm um papel essencial para que a vida em sociedade se estabeleça em patamares dignos. Os serviços públicos relacionados à saúde, por sua vez, dizem respeito aos valores mais fundamentais do ser humano: direito a vida. Não apenas a saúde física, como também a saúde mental, ou seja, possibilitar ao ser humano uma condição de vida digna, e porque não, condições para a busca da felicidade.

A condição de saúde do ser humano tem sido associada a iniciativas relacionadas à arte, como demonstra a experiência já consagrada, por exemplo, dos chamados "doutores da alegria". Sabe-se que tais iniciativas são especialmente eficientes no tratamento de crianças acometidas de doenças, pela sua inata disposição em absorver os prazeres proporcionados pela arte.

O voluntariado tem um papel especial na condução destas iniciativas, é certo, mas por que não se poder partir da organização empresarial como instrumento para os mesmos objetivos de associação do direito à saúde e o acesso à arte?

Como a vocação empresarial é a de organização dos meios de produção para a obtenção do resultado lucrativo e os níveis de tributação impostos às empresas são conhecidamente altos – especialmente ao se considerar a oferta e qualidade dos serviços públicos financiados pelo poder público por meio dos tributos – chamar o empresariado para o cumprimento de funções de caráter público e interesse social pode parecer uma tarefa impossível.

Sabe-se que a empresa trabalha com análise de custos e que suas decisões tendem a seguir um parâmetro econômico de racionalidade, na busca da maximização do ganho. Por outro lado, pela própria limitação das instituições nacionais, deficitárias na oferta de condições de vida ótima para a população, subverte-se a ordem natural do processo econômico e de políticas públicas. Passa-se a conceber um modelo que conduza o empresariado a contribuir para a minimização das carências de políticas públicas sob a premissa de cumprimento de uma função social.

Racionalmente, para que esse intento seja viável, para além da utilização dessa atuação como ferramenta de marketing, somente a criação de incentivos tributários que compensem as perdas de eficiência econômica direta da empresa – pelo exercício de atividades que fogem ao seu objeto típico – tornará factível a até então utópica função social da empresa.

Ainda no que se refere à arte como instrumento de re-estabelecimento da saúde, poder-se-ia estimular a organização de empresas profissionais voltadas à prestação de serviços relacionados à arte, por meio de dança, pintura e outras manifestações de arte e cultura.

Também nessa hipótese o papel das instituições não pode ser desconsiderado, já que a burocracia e as dificuldades para a criação e manutenção de empresas no Brasil propiciam um ambiente desfavorável a essa opção pelo empreendedor.

Instituições fortes, boa vontade empresarial e eficiência podem contribuir para novas formas de relacionamento entre a saúde do individuo e o empresário.

Marcia Carla Pereira Ribeiro é doutora em Direito, professora PUCPR e UFPR, procuradora do Estado e presidente da Associação Brasileira de Direito e Economia. Jussara Meirelles é doutora em Direito, professora PUCPR e procuradora Federal.

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