Estamos a duas semanas das eleições e o debate para o cidadão comum parece estar ligado a um candidato derruba migalhas de pastel e anda de moto sem capacete, ou de outro que concorre graças a um amigo juiz que limpou sua ficha corrida. Esse tipo de abordagem se aproxima da lógica de torcedor de FlaXFlu e acaba deixando de lado questões mais importantes. Uma delas é entender qual candidato vai ser mais efetivo na atração de investimentos externos, no fortalecimento da infraestrutura, geração de empregos e renda e melhor estruturar projetos de parcerias públicas.
O cenário internacional apresenta um momento positivo para o Brasil. Com a guerra da Ucrânia, as questões energéticas da Europa e tensão entre os grandes blocos econômicos, o Brasil pode se consolidar cada vez mais como grande fornecedor global do agro, commodities minerais e puxar para si o protagonismo do mercado de carbono. A liderança da agenda ambiental em harmonia com a produção agrícola vai fortalecer a captação de recursos da economia verde, mas é fundamental uma postura de confiança jurídico institucional.
O governo eleito, qualquer que seja o ocupante do Palácio do Planalto, precisa dar continuidade do programa de concessões e privatizações em curso e até propor evoluções e melhorias.
Não me agradam os economistas com bola e cristal e previsões mirabolantes. Não sabemos até que ponto o cenário do conflito europeu pode recrudescer gerando um aperto monetário e recessão na zona do Euro. Já há indicativos de uma desaceleração da China e de uma crise no Reino Unido com a queda de títulos públicos. É um cenário sombrio, mas entendo que pode ser uma oportunidade para nosso país, de vir a ser o melhor destino para investimentos de longo prazo.
Nos últimos dois anos, o Brasil conseguiu a proeza de captar acima de 800 bilhões de reais em investimento de infraestrutura, já contratado, principalmente nos setores de energia, saneamento e portos. E que devem se materializar em obras ao longo desta década, com aspecto positivo do aquecimento regional, com geração de vagas e um impulso na indústria, comércios e serviços.
O governo eleito, qualquer que seja o ocupante do Palácio do Planalto, precisa dar continuidade do programa de concessões e privatizações em curso e até propor evoluções e melhorias. Devemos evitar a armadilha ideológica de que o Estado deve ser o indutor da economia e que as empresas públicas devem executar e encampar a prestação de serviços públicos. Seria como caminhar na direção oposta do atendimento eficiente ao cidadão e com controle de custos.
Há uma previsão de mais de 8,9 trilhões de reais em potencial de projetos e obras até 2050. É uma oportunidade que não pode ser perdida por questões ideológicas, num eventual governo petista. Há um bom potencial de investimentos, segundo estudos do Carbon Trust nos setores de energia (geração, transmissão e distribuição e refinarias de biocombustíveis), iluminação pública, saneamento, gestão de resíduos sólidos, telecomunicações, transporte urbano, portos, hidrovias e ferrovias.
Só os projetos de geração de energia de baixo carbono envolveriam R$ 1 trilhão, enquanto para o transporte urbano limpo seriam necessários R$ 475 bilhões. Se as diretrizes previstas no estudo fossem seguidas, os oito setores podem gerar mais de 2 milhões de empregos diretos ao longo de duas décadas. E há disponibilidade de capitais para este tipo de proposta, mas é preciso projetos bem estruturados e governos que inspirem confiança. O Brasil de Paulo Guedes recuperou um pouco de sua confiança internacional, mas ainda há espaço para avanços.
O que está acontecendo na América Latina é que muitos governos estão deteriorando seus fundamentos econômicos em função de políticas populistas. Já o Brasil melhorou posições, se colocando como a terceira economia entre as emergentes, na condição de atração de investimentos e confiança, atrás da China e Emirados Árabes. O estudo publicado pela consultoria Kearney coloca o Brasil em 22º lugar global. E o que pode ser feito para melhorar nossa posição no curto prazo? São três passos simples que o futuro mandatário deve seguir.
Primeiro manter o teto de gastos. Evitar aventuras fundamentalistas, como na era Dilma, onde os economistas criativos abusaram da intervenção do Estado na economia, induzindo consumo, e favorecendo alguns mercados em detrimento de outros, inchando as empresas estatais e obras superfaturadas. Os princípios de austeridade fiscal e da economia de mercado devem ser mantidos, tão somente porque dão um exemplo de rigor e confiança que qualquer investidor deseja.
Um segundo aspecto, já foi mencionado, é um ambiente jurídico estável com regras e contratos que dá segurança ao investidor. Nenhum executivo de um fundo financeiro vai trazer recursos para um país, onde de um dia para outro o governo muda as regras contratuais, ou promove um confisco bancário ou expropria ativos.
O terceiro passo proposto é que o ambiente da estruturação de projetos atenda a critérios de governança, padronização de transparência. O Reino Unido, que é atualmente o país mais desenvolvido no mundo em Parcerias Público Privadas, possui uma entidade nacional que centraliza todas as iniciativas. Desenvolveu uma metodologia para aumentar a assertividade de seus projetos de infraestrutura. É uma experiência que podemos adaptar, considerando as condições locais.
Hoje temos uma Secretaria Especial do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), criada em 2016, e que tem por finalidade fortalecer a interação entre o Estado e a iniciativa privada por meio da celebração de contratos de parceria e de outras medidas de desestatização. Ocorre que o PPI atua principalmente com projetos federais. E defendemos que esta estrutura passe a atuar de modo transversal em todos os setores da infraestrutura, inclusive na área ambiental e social, em projetos de parques, manutenção de reservas nativas, construção e manutenção de escolas, penitenciárias e hospitais. E além dos setores já conhecidos de transportes urbanos, energia, ferrovia e sistema de logística, saneamento e resíduos sólidos.
Resumidamente, os três passos para melhorar nossa atividade são: manter uma política econômica segura, confiável e sem rompantes, com estabilidade jurídica, e finalmente organizar um núcleo de estruturação de projetos nacional, coordenado e mantendo um padrão comum na estruturação. São milhares de projetos federais, mas também da alçada de municípios ou dos estados, que podem ser desenvolvidos em diferentes arranjos, mas que para terem continuidade e não venham a sucumbir, precisam ter uma metodologia e padronização de critérios para seu desenvolvimento. O BNDES, por sua expertise técnica e estratégica, parece ser o ambiente mais indicado para esse centro de inteligência e atuar como difusor das boas práticas.
O desafio para a economia brasileira do ciclo virtuoso da prosperidade e bem-estar sustentável nos próximos anos está no aumento da atratividade do capital privado para nossa carteira de projetos de infraestrutura.
Alberto Gallo é especialista em infraestrutura e gestão pública.