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O debate central da última semana girou em torno de uma abordagem particular do presidente americano Donald Trump para taxar outros países. Essa política se diferenciava por não focar nas regras internas de impostos de cada nação (suas políticas fiscais), mas sim na chamada balança comercial. Simplificando, trata-se da diferença entre o volume de produtos que os Estados Unidos compram de um determinado país e o volume que vendem para ele. Isso impacta diretamente o Brasil - e o Paraná.
Se os EUA importam muito de um país – frequentemente matéria-prima de nações com economias menos desenvolvidas, adquirida de poucos empresários locais – o fluxo de entrada de produtos nos EUA é alto. Contudo, se esse mesmo país compra poucos produtos norte-americanos, talvez por não conseguir reinvestir o capital que obtém com suas vendas para gerar mais riqueza e capacidade de compra interna, cria-se um desequilíbrio do ponto de vista norte-americano, até por conta de que a maioria desses negócios são feitos por empresários dos países e não por seus governos.
O Paraná não pode focar apenas em impulsionar as exportações, visando o lucro dos grandes empresários, sem considerar o impacto disso no bolso da população local. É fundamental que o estado também desenvolva políticas para proteger o mercado interno
O exemplo de Lesoto, um país africano taxado por vender muitos diamantes aos EUA, mas comprar pouco em retorno, ilustra essa lógica. Era essa diferença, entre o que entrava e o que saía em termos de comércio, que servia de base para a fórmula de taxação do governo Trump.
Mas qual a conexão disso tudo com a realidade do Paraná? A ligação surge porque, quando países enfrentam novas taxas ou barreiras comerciais impostas por um parceiro importante como os EUA, eles naturalmente buscam novos mercados e fornecedores. Se um país que comprava produtos norte-americanos agora enfrenta taxas, ele pode procurar comprar de outro lugar. Da mesma forma, um país taxado pelos EUA pode buscar novos compradores para seus produtos. É nesse cenário que o Paraná, um estado com forte vocação agrícola e que se promove como um "mercado do mundo", possui uma oportunidade. Para os grandes produtores e exportadores paranaenses, essa reconfiguração do comércio mundial pode significar a chance de vender ainda mais para o exterior.
No entanto, essa oportunidade carrega consigo um problema em potencial para quem vive no estado. Entra em jogo um princípio básico da economia: a lei da oferta e da demanda. Quando o Paraná direciona uma parte maior de sua produção pecuária (frango e carne bovina, por exemplo) para a exportação, atendendo a essa nova demanda externa, a quantidade desses mesmos produtos disponíveis para venda dentro do próprio estado diminui. Se a oferta interna cai, mas a procura dos consumidores paranaenses continua a mesma, a tendência natural é que os preços desses produtos subam aqui dentro. Isso se traduz diretamente em inflação, especificamente no custo dos alimentos para a população local, aumentando o custo de vida.
Além dessa perspectiva – a possibilidade de aumento das exportações e o consequente risco de inflação interna –, o governador do Paraná anunciou a criação de um fundo destinado a apoiar o agronegócio estadual. A forma como esse anúncio foi feito gera críticas. Realizado na sede da B3 (a bolsa de valores brasileira), em São Paulo, mostra um sinal de que o foco estaria mais nos grandes players do mercado financeiro e nos interesses de grandes empresários, em linha com outras ações do governo percebidas como favorecimento a grupos específicos. Essa abordagem é contrastada com as dificuldades enfrentadas pelos pequenos e médios produtores rurais do estado, que lidam com problemas como os custos e a instabilidade no fornecimento de energia após a privatização da Copel.
É inegável que o setor agropecuário do Paraná precisa e merece incentivos – como já fizemos com políticas como fundos de aval para garantir empréstimos, apoio à irrigação noturna (que economiza água e energia) e outros fomentos que implementamos com sucesso no passado.
A questão crucial, no entanto, é a necessidade de equilíbrio. O Paraná não pode focar apenas em impulsionar as exportações, visando o lucro dos grandes empresários, sem considerar o impacto disso no bolso da população local. É fundamental que o estado também desenvolva políticas para proteger o mercado interno, garantindo que a produção de alimentos para os paranaenses seja suficiente e que os preços permaneçam acessíveis, evitando que o sucesso no comércio exterior se transforme em dificuldade e aumento do custo de vida para as pessoas dentro do próprio estado.
Requião Filho é deputado estadual no Paraná.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos