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Há tempos a população vem sentido na pele a explosão da criminalidade nas cidades, com ondas de violência que acabam por nos tomar pela intensidade e banalização. Os especialistas de plantão tentam explicar o fato: ora é a péssima distribuição de renda do país, ora a expansão do "crack", ora a ineficiência das forças de segurança. Quando não, seriam todos estes fatores reunidos os culpados pela nossa falência como sociedade organizada, com um Estado incapaz de garantir a segurança pública num nível minimamente civilizado. É certo que cada uma destas vertentes tem sua dose de influência. Entretanto, consideradas individualmente, falham ao tentar explicar a escalada da violência.

É forçoso reconhecer que nada acontece por acaso. O criminoso possui vários impulsos motivadores. Todavia, o foco principal não deve recair pura e simplesmente na análise dos fatores sociais que movem o delinquente ou das falhas na legislação, como costumeiramente se tem visto. A mola-mestra do problema reside nas questões afetas à estruturação da polícia judiciária e da polícia preventiva. É aqui que se ousa romper com o senso comum e com a verdade estabelecida.

É óbvio, independentemente das carências e dificuldades verificadas na órbita administrativa, que a organização dos órgãos de segurança pública estaduais, nos moldes previstos pela Constituição Federal, está fadada ao fracasso. Não há razoabilidade ou racionalidade em aplicar-se tal modelo hoje. Esse sistema não diferencia o crime organizado do crime corriqueiro, do delito do dia-a-dia. Não consegue dividir adequadamente os parcos efetivos policiais, deixando de dar uma resposta eficaz às grandes demandas sociais, nivelando tudo por baixo. Com isto, em regra, os estados acabam por despender grandes recursos na apuração de pequenas infrações, deixando de lado a investigação de delitos com intensa repercussão.

O estado (entendido como unidade da federação), nos dias atuais, jamais poderia ser o único responsável pela segurança pública nos municípios. Sua missão deveria ser semelhante à delegada à Polícia Federal, ou seja, apurar infrações penais em detrimento de bens, serviços e interesses do estado ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como infrações cuja prática tenha repercussão intermunicipal e exija repressão uniforme (repressão a quadrilhas e congêneres que atuem por toda a extensão do ente federativo, por exemplo). Noutros termos: seria muito mais razoável delegar ao estado apenas o combate ao crime organizado, aos delitos praticados por organizações estruturadas e não esporádicas, bem como aos que afetem o interesse deste estado ou de sua população. Com isto, seus policiais poderiam ser mais bem treinados, remunerados e fiscalizados, preparados adequadamente para enfrentar este tipo de criminalidade. Seria um serviço de inteligência e de força, mas com atuação pontual.

Aos municípios caberia a apuração dos delitos comuns, praticados em regra por criminosos ocasionais ou sem qualquer espécie de organização, como lesões, pequenos furtos, estelionatos, infrações com menor potencial ofensivo etc. Com isto, cada município poderia aferir qual o efetivo necessário para executar tal missão, disponibilizando policiais de acordo com a demanda e pagando salários compatíveis. Tudo regulamentado por lei federal, que, inclusive, fixaria requisitos para o exercício do cargo. Nunca é demais olvidar que esta polícia municipal seria fiscalizada pela sociedade civil, pelo Ministério Público Estadual, pelo Poder Judiciário, como também por si mesma, através de controles internos.

Há exemplos de bom funcionamento de guardas municipais, que exercem serviços apenas de vigilância, mas que seguramente serão os embriões desta nova polícia.

O modelo que aí está é arcaico, anacrônico e ineficiente. Foi concebido numa época e numa realidade muito distante daquela que experimentamos nos dias atuais. É preciso mudar. Mas, para que as transformações necessárias se façam valer, o debate é imprescindível.

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