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O papa Francisco é um comunicador de primeira. Simples. Direto. Desimpedido. Seu estilo é surpreendentemente solto e provocador. Seu discurso é coloquial e sincero. É um papa falante, alegre, com jeitão laico. Um papa diferente. Mas é o papa. E tem plena consciência do seu ministério e de sua autoridade. Não pode ser interpretado pela metade. Ele demanda contexto. Francisco dá boas manchetes, mas é preciso ir ao cerne do seu pensamento. Cria-se, caso contrário, a síndrome da esquizofrenia informativa: um papa fala na manchete, mas outro discursa no conjunto da matéria.

Recentemente, foi publicada uma longa entrevista com o papa Francisco. O rebuliço foi imenso. Sobrou versão. Faltou fazer a lição de casa básica: ler a íntegra da entrevista. Francisco, como bem salientou a jornalista Adriana Dias Lopes, da revista Veja, "não mexerá nas doutrinas da Igreja Católica". Mas, sem dúvida, apontou uma mudança de tom.

O papa, creio, quer provocar uma ruptura com uma agenda negativa e reativa. "Não podemos insistir somente sobre questões ligadas ao aborto, ao casamento homossexual e ao uso de métodos contraceptivos. Isso não é possível. (...) De resto, o parecer da Igreja é conhecido, e eu sou filho da Igreja. A proposta evangélica deve ser simples, profunda, irradiante. É dessa proposta que vêm as consequências morais", sublinhou o papa.

Francisco, por óbvio, não minimiza a gravidade dos equívocos morais. Sua defesa da vida desde o momento da concepção é clara, forte, sem qualquer ambiguidade. A doutrina é transparente. O papa está preocupado não apenas com a atuação pública da Igreja, mas com o cuidado pastoral das pessoas concretas. Que erram. Que sofrem. Que se arrependem. Seu foco não são os processos, mas as pessoas. Quer uma Igreja mais compassiva. E isso é cativante.

A perspectiva do olhar de um Deus compassivo, acolhedor, está metida na alma de Francisco e ganha corpo no seu projeto pastoral. "A coisa de que a Igreja mais necessita agora é a capacidade de curar feridas e de aquecer o coração dos fiéis, aproximar-se. Vejo a Igreja como um hospital de campanha depois de uma batalha. É inútil perguntar a um ferido grave se o seu colesterol ou sua glicose estão altos. Deve-se curar as feridas. Depois podemos falar do resto." Francisco insiste muito na essência da mensagem cristã: a misericórdia de Deus.

Impressiona, e muito, o tom positivo que permeia todos os discursos do papa. Impressiona, também, a transparência de Francisco em suas entrevistas aos jornalistas. É uma papa sem tabus. Ele tirou a Igreja do córner. Francisco rasga um horizonte valente e generoso. Deixa claro que os católicos não são antinada. O Cristianismo não é uma alternativa negativa, encolhimento medroso ou mera resignação. É uma proposta afirmativa, alegre, revolucionária. Os discursos do papa não desembocam num compêndio moralizador, mas num desafio empolgante proposto por uma pessoa: Jesus Cristo. Os jovens entendem o recado e mostram notável sintonia com Francisco.

Os que apostam na descontinuidade vão perder o jogo. João Paulo II, Bento XVI e Francisco tocam a mesma música, embora com gingado diferente. A surpreendente rapidez da eleição de Francisco foi um testemunho inequívoco de que João Paulo II e Bento XVI, ao longo dos seus pontificados, investiram generosamente na construção da unidade da Igreja. A eleição meteórica de Bergoglio foi, no fundo, um forte chamado à unidade e à continuidade.

Carlos Alberto Di Franco, doutor em Comunicação pela Universidade de Navarra, é diretor do Departamento de Comunicação do Instituto Internacional de Ciências Sociais (Iics).

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