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| Foto: Robson Vilalba/Thapcom

A isenção de Imposto sobre a Renda (IR) na distribuição de lucros e dividendos foi introduzida no ordenamento jurídico pelo artigo 10 da Lei 9.249/1995 e alcança sócios e acionistas de pessoas jurídicas que tenham optado pelo regime de tributação pelo lucro real, presumido ou arbitrado. Referida isenção significa, na prática, que não há retenção de tal imposto na fonte quando há distribuição de lucros e, também, que o lucro distribuído se insere na categoria de rendimentos isentos e não tributáveis no âmbito da declaração anual de ajuste.

A desoneração em questão é bastante criticada porque estaria em desacordo com um sistema fiscal justo, no qual deveria imperar a isonomia e a progressividade da tributação, ou seja, em que seriam tributados mais pesadamente os mais ricos.

Almejamos uma sociedade em que a justiça fiscal seja efetiva e redistributiva

Definitivamente, não temos um Estado idealmente justo em matéria tributária; no entanto, o conceito de justiça não está vinculado à cobrança de um imposto ou à eliminação de apenas uma isenção tributária. O conceito de justiça tem natureza eminentemente filosófica e não é unívoco, divergindo, embora de forma tênue, na concepção de cidadão para cidadão. Intimamente ligado ao conceito de ética, deve estar em harmonia com a moral média da sociedade.

Não defendemos incondicionalmente todo e qualquer benefício fiscal, até porque já foi empiricamente comprovado que referidas benesses frequentemente são injustas. Almejamos uma sociedade em que a justiça fiscal seja efetiva e redistributiva; no entanto, estamos seguros de que o que é justo em um sistema pode não o ser em outro, já que as sociedades e os seus problemas divergem entre si. Temos, de fato, um sistema tributário regressivo, complexo, que desestimula a atividade econômica e o empreendedorismo e que é, portanto, injusto. É de se questionar, então, qual é o significado de justiça fiscal para o sistema brasileiro? Justiça fiscal tem um sentido universal?

A isenção de IRPF em relação aos lucros distribuídos é uma medida polêmica e que merece atenção; no entanto, encontra amparo em argumentos relevantes como a simplificação na fiscalização e a redução da evasão fiscal.

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As políticas econômicas dos países democráticos caminham no sentido de evitar a dupla ou múltipla tributação da renda. Há países que não tributam o lucro da pessoa jurídica e apenas o fazem em relação à pessoa física; outros, como o Brasil, tributam apenas o lucro da pessoa jurídica; e há, ainda, aqueles que tributam ambos, mas concedem um crédito relativo ao IR pago pela pessoa jurídica. Por fim, existem aqueles que tributam o lucro da pessoa jurídica e, também, a sua distribuição para a física, sem que haja a concessão de qualquer benefício, mas esta tributação, se considerada de forma integral, equivale àquela a que hoje estão sujeitas as pessoas jurídicas no Brasil. É possível revogar a isenção em questão, mas, em contrapartida, a tributação do lucro da pessoa jurídica deve ser amenizada, como o é nos países que tributam o lucro da pessoa jurídica e, também, a distribuição para a pessoa física.

Assim, faz-se necessário pensar em uma alteração global do sistema tributário, que o simplifique e o torne mais justo. Medidas pontuais, como a revogação da isenção em questão, seguramente não solucionarão as perplexidades que nos acometem. O momento é favorável à reforma do sistema constitucional tributário e é, portanto, propício para a promoção de mudanças profundas e consistentes que, em concerto, restabeleçam a ética e a justiça na tributação.

Betina Treiger Grupenmacher, advogada com pós-doutorado na Universidade de Lisboa, é professora de Direito Tributário da UFPR.
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