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A quem cabe julgar a importância de uns em relação a outros? No final de 2019, o deputado Leonardo Monteiro (PT-MG) fez um requerimento de audiência pública no Congresso para debater o marco regulatório dos Jogos de Azar no Brasil (req 119/19), para ouvir diversos setores sobre o tema. Em entrevista à Games Magazine, ele enfatizou: “existem aspectos sociais, de saúde, religiosas e até financeiras a partir do vício de jogos, num país em crise, que precisam ser levados em consideração”.

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Até aí, tudo bem. Contudo, um convidado da audiência, o deputado Bacelar (PODE-BA), que coordena a Frente Parlamentar Mista pela aprovação do Marco Regulatório dos Jogos afirmou que segundo a Organização Mundial da Saúde - OMS a prevalência de pessoas com ludopatia (vício patológico em jogos) no mundo está entre 0,2% e 0,3%. Há alguns problemas nessa declaração, a começar que, segundo a OMS, a prevalência estimada vai de 0,1% a 6% da população e não a 0,3% como afirmado. Os dados são do trabalho “Epidemiologia e impacto do jogo patológico e outras ameaças relacionadas a apostas” (“The epidemiology and impact of gambling disorder and other gambling-related harm” no original).

Chama a atenção na declaração o desdém que Bacelar mostra com esse número, afirmando que o total de doentes é insignificante no debate da liberação. Se pegarmos o menor índice exposto (0,1%) e colocarmos na população brasileira, cerca de 210 milhões de pessoas, são 210 mil pessoas com potencial para desenvolverem compulsão por apostas.

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Para efeito de comparação, segundo a Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein (conhecida pelo Hospital Albert Einstein), a taxa de prevalência de esclerose múltipla é de 0,002%, sendo 40 mil doentes no Brasil – menos de ¼ dos possíveis ludopatas. Outra doença autoimune rara é a Miastenia Gravis, com prevalência de 0,03% segundo a OMS. No Brasil, se estima que haja 40 mil miastênicos, de acordo com o site da única empresa que fábrica o remédio de uso contínuo necessário para viver com a doença, Mestinon.

Em outras palavras, a indiferença do deputado Bacelar com os possíveis ludopatas que vão surgir no Brasil equivale a dizer que podemos deixar de lado todos os brasileiros portadores de esclerose múltipla, mais todos os miastênicos e ainda sobram mais 100 mil doentes com outra patologia a serem jogados para escanteio. Isso se levarmos em conta só o índice de 0,1%.

Não podemos ignorar paciente algum, não importa qual a prevalência da sua doença (se é rara ou comum), muito menos a sua letalidade. Na Constituição de 1988, Art. 196, lemos “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”, mas quanto custa tratar um ludopata? Um estudo da Universidade Baylor, localizada no Texas-EUA, do PhD em Economia pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), Earl Grinols, responde essa pergunta: US$ 9.393 anuais por paciente. Se somarmos metade da menor prevalência numa estimativa bem otimista, são 100 mil pessoas a serem tratadas, ou seja, um custo anual cerca de R$ 3,8 bilhões, uma soma nada ignorável.

*Roberto Lasserre, coordenador nacional do Movimento Brasil sem Azar

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