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"Venezuela e Ucrânia são situações absolutamente díspares", ressaltou a presidente Dilma. Com toda a razão. Entretanto, muito além de toda a disparidade que diferencia ambas as situações, algo há em comum: tanto Venezuela quanto Ucrânia consistem em alvos dos interesses geoestratégicos e energéticos da agressiva política externa norte-americana.

A Venezuela é palco de sucessivas tentativas de desestabilização de seu governo democraticamente eleito e socialmente orientado, desde a primeira eleição de Hugo Chávez. Cabe lembrar que, de acordo com a Cepal, a Venezuela tornou-se, após o chavismo, o país com melhor distribuição de renda na América Latina. Como mesmo após a morte do líder a oposição saiu derrotada das urnas, o que resta é uma alternativa ilegítima impulsionada pelo governo norte-americano.

As motivações que levam ao intervencionismo são facilmente compreensíveis, já que se trata do país detentor das maiores reservas de petróleo do mundo (ainda que se trate de um petróleo pesado com alto custo de refinação), cuja situação geográfica situa-o como vizinho dos Estados Unidos, e que, ao contrário de uma década atrás, hoje exporta grande parte de sua produção para a China. E lembre-se que a Venezuela de Chávez foi o único país latino-americano, na virada para o século 21, a se opor à tentativa dos Estados Unidos de estender as diretrizes do Consenso de Washington por todo o continente, por meio da pretensa Área de Livre Comércio das Américas (Alca). A partir de então, a ascensão de vários governos pós-neoliberais na região permitiu mudar o acento para os processos de integração Sul-Sul, a exemplo do Mercosul e da Unasul, em lugar dos acordos de livre comércio com a potência hegemônica. O resultado foi um progressivo isolamento dos Estados Unidos em sua área de influência estratégica: a América Latina.

Por outro lado, a Ucrânia é um país de extrema relevância do ponto de vista estratégico, e o mais importante para a segurança da Rússia. Embora se pretenda que a situação seja simples, qual seja, uma maioria da população ucraniana ansiando integrar um bloco econômico em crise profunda, como a União Europeia, que mantém índices altíssimos de desemprego, a crise tem raízes bem mais complexas e conta com a ingerência dos Estados Unidos. Os objetivos da ingerência estadunidense na Ucrânia devem-se não apenas ao temor da retomada da influência russa no ex-espaço soviético, de que deriva o propósito de integrá-la à estrutura militar da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), como também se devem ao fortalecimento da Europa como interlocutor da Rússia em questões estratégicas, ao medo de uma reaproximação entre Alemanha e Rússia, mas, principalmente, ao fator energético. Por óbvio, a Rússia não admitiria facilmente um governo pró-ocidental em um país estrategicamente fundamental para sua segurança. Desde a época da extinta União Soviética, mais de 80% do gás natural russo é transportado para a Europa pela Ucrânia.

Venezuela e Ucrânia, portanto, têm, sim, algo em comum: sua importância do ponto de vista geoestratégico e energético para o mundo ocidental, e o fato de terem desafiado, de diferentes formas, os rumos previstos pela hegemonia global.

Larissa Ramina é professora de Direito Internacional da UFPR e da UniBrasil.

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