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E, como ia dizendo, já é tempo de fazer um elogio da ignorância. Como ninguém a fez, faço-a eu, embora Erasmo tenha feito o elogio da loucura com maior sabedoria e melhor estilo.

A desgraça humana começou, de acordo com a Bíblia, quando o primeiro homem e a primeira mulher foram tentados a conhecer tudo, o Bem e o Mal, comendo o fruto proibido da árvore da sabedoria. Foram expulsos do Paraíso: o homem condenado a comer com o suor do rosto, e a mulher, a parir seus filhos com dor.

Tudo teve início aí, a própria história. Surgiram crimes, guerras, inundações, literalmente o diabo. Se continuássemos ignorantes, não teriam acontecido a queda das bolsas e a subida da temperatura terrestre.

Bastaram alguns dias fora do país, gozei um estado de graça que não me tornou feliz, mas tranqüilo. No único telefonema que dei para o Brasil, soube da morte do Fernando Barbosa Lima, do Fernando Torres e do Fausto Wolff. Evitei dar ou receber outros telefonemas. Não precisei enterrar a cabeça na areia, como dizem que faz o avestruz. E – por Júpiter – atingi um grau de ignorância bem acima da habitual ignorância a que estou acostumado e já resignado.

Sempre invejei aquele anacoreta que Zaratustra encontrou na montanha. Retirado de tudo, em sua sábia ignorância, ele apenas rezava, chorava e murmurava. Não sou muito de rezar e de chorar, mas acho um estranho prazer em murmurar. É o que estou fazendo pela vida afora, inclusive nesta crônica de volta ao trabalho.

Falei em Erasmo e no seu elogio da loucura. Lembrei Nietzsche, que, além do Zaratustra, elogiou o ócio, mas advertiu: "Estou elogiando o ócio, não me refiro a vós, oh preguiçosos!".

Atentai: estou elogiando a ignorância, mas não a burrice.

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