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"E Deus viu tudo quanto havia criado, e era muito bom" (Gn 1,31).

Desde o princípio, nos diz o livro do Gênesis, Deus se manifesta na história com sua força de poder criador e vivificador. Ao organizar o Universo, Deus deu a tudo o seu lugar, numa ordem dinâmica e harmônica, e viu que tudo o que havia feito era muito bom. Essa primeira página da Bíblia não deve ser compreendida como uma descrição científica e evolutiva da criação, mas como uma bela liturgia, que celebra o ato criador do Deus vivo, sua providência e sua presença na história humana.

O poema da criação é um verdadeiro Evangelho, uma boa notícia a todos os povos. Na raiz de todas as coisas criadas está o Deus da vida que comunica sua bondade e ternura a todos os seres criados. No centro dessa criação está o ser humano, criado à imagem e semelhança de Deus, como sujeito e protagonista de sua história. O poema da criação, descrito numa linguagem poética e catequética, destaca o plano amoroso de Deus no ato de criar e organizar o mundo. É preciso salientar a importância e a seriedade desses textos para a vida e tradição da Igreja. Aí se encontram os problemas básicos para a fé e teologia: a criação e a evolução do mundo material; a compreensão da antropologia bíblica, a ecologia e a ordem do mundo como ambiente e espaço da vida humana e de todos os seres da Terra.

O autor mostra os alicerces e estruturas fundamentais dos acontecimentos e realidades da existência. Trata-se de modelos para compreendermos nossa vida e nossa história. Jesus Cristo inaugura uma nova criação, baseada na reconciliação das criaturas com o seu Criador e entre si, rompida pelos pecados de soberba e do egoísmo. A natureza criada pelo Verbo, é reconciliada com Deus pelo Filho encarnado. A criação do ser humano, homem e mulher, feito à imagem e semelhança de Deus é apresentada como o coroamento de toda obra criadora.

"A criação deve ser vista e aceita por todos como boa na sua totalidade, boa porque é um dom de Deus; boa, porque é meio ambiente em que todos nós fomos colocados e no qual vivemos a nossa vocação, em solidariedade uns com os outros".(Paulo VI, Dia Mundial do Meio Ambiente 1977). Mas não podemos cair no engano de pensar que a bênção que Deus dá ao ser humano, "enchei a terra e submetei-a" (Gen 1,28), significa que nós podemos fazer com a natureza tudo o quer quisermos. A expressão "submeter" poderá ser traduzida por "governar", "cuidar", "preservar", "conviver". Isso não é autorização para grilar terras, devastar ambiente, poluir as águas, matar os animais sem nenhuma razão, causar a morte. "Encher a terra e submetê-la" também não significa concentrar riquezas e fazer violência à criação.

O que Deus pede ao homem e à mulher é preservar nosso planeta, cuidar e zelar por esta nossa casa comum e por tudo que nela habita com a mesma paixão amorosa de Deus Criador, em vista da felicidade de todas as pessoas e de todos os seres vivos. Com Deus e com a força de seu Espírito, nós, homens e mulheres, temos a graça de continuar sua obra criadora, lutando contra todos os males que ameaçam a vida do planeta, contra violência presente em todas as páginas da história humana. Participaremos, assim, de um processo permanente de criação e recriação, que só terminará quando pudermos viver sem dor e luto na "terra sem males" que todos sonhamos. O jardim a cultivar e guardar é a nossa realidade local, mas é também o planeta inteiro. Hoje sabemos que temos o poder de destruir globalmente a vida, se não cuidarmos localmente da preservação desse pedaço do sistema solar que Deus nos deu. A Amazônia é chamada "pulmão do mundo". Esse "órgão vital" foi entregue aos nossos cuidados, para deter tudo o que polui, destrói, inviabiliza a vida nessa grande casa de todos nós, o nosso bonito planeta azul.

Dom Moacyr José Vitti é arcebispo metropolitano.

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