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O professor orientou a equipe a fazer marcação homem a homem, mas o adversário estava com esquema tático recuado e aproveitou um vacilo da nossa defesa. Tentamos, mas não fomos felizes nas finalizações. Acresça-se respiração ofegante, português capenga e está pronta a entrevista padrão dos jogadores a caminho do vestiário depois de derrota inesperada.

As coisas se sofisticaram e alguns ídolos têm assessoria de comunicação, fazem cursos de expressão oral e gestual; usam penteados que resistem ao esforço dos 90 minutos e a cada aparição a marca do patrocinador salta para a retina do fã, ainda que seja num relance da ribana da cueca. As chuteiras fosforescentes, camisetas que não revelam a sudorese, compõem figurino estudado para os gladiadores metrossexuais, com toques de mocinho/bandido ao estilo Beckham.

Os telões dos estádios são os novos espelhos da bruxa: atletas os miram para ver se estão bem na foto e se há resposta para a indagação se há alguém mais belo. Exibição explícita de vaidades e, em raros momentos, de genialidade cinética.

Cristiano Ronaldo, o Apolo da geração narciso, depois de duas horas no cabeleireiro, cremes, laquê, entrou em campo de salto alto e sumiu diante do futebol quase alegre dos alemães. Sim, o Müller da Alemanha tem jeito tão festeiro que parece um alemão da roça na Oktoberfest em Blumenau. O feioso brilhou muito mais que o bonitão. Diga-se, a foto da Angela Merkel com a seleção germânica pareceu provocação à nossa presidente.

A beleza do esporte é a surpresa. Analistas emitiram milhões de palavras ao vento para dizer que a Espanha era uma das favoritas. A equipe mais experiente; sede dos grandes times europeus; meca dos jogadores mais famosos do mundo. O galeão espanhol soçobrou nas costas do Chile depois das avarias que sofreu no enfrentamento com a Holanda. Duas derrotas acachapantes liquidaram a majestade e a pose. Daqui a algumas horas devem estar em voo para casa a tempo de fazer mesuras ao novo rei. Campeões ontem; perdedores hoje de modo que nem os pessimistas vaticinaram.

Os calafrios dos norte-americanos diante da seleção de Gana lembram o trauma do Brasil diante do Uruguai. O futebol iguala anões e gigantes. A res do gramado, a guerra tem regras e juiz. Toda a tecnologia, riqueza, fica igualada. Os americanos foram a campo ansiosos para a desforra e venceram no aperto. Deslumbrante ver país ignoto da África, onde as pessoas ainda têm fome, marcando sua identidade e humanidade diante dos representantes da maior potência da Terra.

Há magia nesses dias repletos de jogos. O mau humor dos black blocs ficou restrito ao gueto e a festa está boa. Até o papelão dos chilenos ao invadir o Maracanã foi mais festivo do que agressivo. As torcidas deram espetáculos de paixão e alegria nos estádios e os apupos aos políticos demarcam o espaço entre comunidade e governo; ali a sociedade é mais relevante que o Estado. Os jogadores fazem o espetáculo para o povo, não para o césar benemérito que distribui pão e circo.

O futebol é mesmo uma caixinha de surpresas.

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