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Distante uma semana da tragédia que levou dezenas de vidas jovens, escrevo ouvindo A Idade do Céu na voz de Jorge Drexler e cala fundo o verso que diz para deixar que o beijo dure, que o tempo cure, que a alma tenha a mesma idade do céu. Há tudo a doer, a dizer, a pungir o coração. Nada do que se diga explica, justifica, muda fatos e emoções. Os discursos usuais sobre a expectativa de que a dor sirva para alguma coisa são bem intencionados, mas de pouco resultado. Temos apego à irresponsabilidade como se denotasse leveza de ser. Nossos heróis não têm caráter e são inimputáveis. Os retos, exigentes, inconformados com a covardia e preguiça são rejeitados como antiquados, esquisitos, conservadores. A brasilidade é dúbia: linda numa face, horrenda noutra.

Convicto de que a dor era evitável, não um fado, angustio-me e decido chegar ao leitor com tema que evoca o futuro e dá a sensação de que a trama do tecido da vida se esgarça numa ponta ao mesmo tempo em que é cerzida em outra. A vida é persistente: rotos e remendados, seguimos adiante.

A Europa – exemplo forte de rupturas e remendos – está investindo o equivalente a R$ 3 bilhões na pesquisa das aplicações do grafeno, para gerar nova revolução industrial, com as implicações de supremacia política e econômica, a exemplo da ocorrida no século 19. Nos tristes trópicos sequer sabemos o que é grafeno. Mas deveríamos saber, para não quedarmos na idade do plástico enquanto a parte civilizada do mundo entra na era das redes de carbono fabricadas com nanotecnologia.

Átomos de carbono são dispostos um a um como pontas de hexágono. Entre eles se estabelece ligação formando rede com vãos sextavados. Tudo em escala microscópica, perceptível apenas em equipamentos potentes. Cada nó da rede é um átomo de carbono que mede 340 picômetros (10 elevado a –12), tão pequeno, incompreensível pelos sentidos. Se pudéssemos ver uma rede de grafeno, ela se assemelharia à rede de pesca pendurada no varal.

A rede de grafeno é mais leve e mais forte que qualquer material natural ou sintético conhecido. Se fosse possível fazer rede de aço no mesmo tamanho, seria dezenas de vezes mais pesada e mais fraca. O carbono não enferruja (não solta as tiras e não tem cheiro), não apodrece, não retém sujeira. Serve, por exemplo, para peneirar o sal da água do mar, visto que uma molécula de água passa no vão, mas os grânulos salinos são retidos. Água doce, pura, sem bactérias e vírus, a baixo preço. Para chineses, hidrocidas em massa, pode ser a salvação.

Imaginem-se redes de pesca superpostas simetricamente, de modo que os vãos e nós ficassem alinhados. A folha resultante seria maleável, permitiria a passagem da luz (transparência). A lâmina de grafeno faz isso e, ainda mais, permite o trânsito de eletricidade, com pouca resistência ao movimento dos elétrons. Ela não esquenta como os chips de computadores atualmente feitos de areia sílica. Em tese, dá para tecer camiseta de grafeno que seja também computador, televisor, telefone, máquina fotográfica, conversor de energia solar. Ao conhecimento físico-químico e à habilidade de aplicá-lo parece não haver limite.

Os europeus investem na inteligência. Entorpecidos de preguiça macunaímica, deixamos a inteligência morrer.

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