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A ideologia que nutre o corpo educacional brasileiro é a crença no bom selvagem, um avatar da filosofia que pode ser definido como alguém que desde o berço tem vontade de aprender, produzir, amar o próximo, a paz e respeitar o meio ambiente. Angelical. Essa é a matriz que determina as opções sobre o conteúdo das matérias, método de ensino, avaliação do aprendizado, exigências de ética e disciplina dos alunos.

O fato de que esse bebê do bem se transforme num demônio na adolescência é resultado da corrupção causada pela sociedade que desiguala as pessoas, especialmente porque algumas têm acesso a bens materiais e outras não. Assim, basta eliminar a causa da desigualdade – a propriedade particular – para que a bondade inata resplandeça e a maldade suma da face da terra.

O raciocínio singelo é desmentido pela realidade, na qual egoísmo e altruísmo estão presentes numa mesma pessoa em combinações absolutamente únicas, resultantes da interação entre natureza e cultura, entre hardware e software. As pessoas não são iguais. Se fossem cópias uns dos outros, nada valeriam. A originalidade é que faz cada pessoa tão valiosa quanto outra. Não há superioridade na condição humana e nisso há igualdade. O reconhecimento dessa igualdade é que o se chama de dignidade humana. Iguais no que toca a serem diferentes uns dos outros. Esse é o ponto de igualdade.

Hitler e Stalin eram humanos como Mandela e Martin Luther King. A igualdade na condição humana implica tratamento igual para tudo? Com as adequações à sala de aula, onde normalmente não há gigantes da maldade ou da bondade, o exemplo serve para mostrar que tratar os desidiosos e os operosos da mesma maneira estimula uns à vadiagem e outros a não expender energia para receber reconhecimento do mérito, nivelando-os por baixo.

Por deferência à dignidade, estímulos e inibições, prêmios e castigos devem ser adequados às diferenças. Tratar a todos como se fossem clones do bom selvagem é desumanizar, desconsiderar a individualidade da pessoa. Aprovar os bons e os maus alunos para que os de menor rendimento não se sintam vexados é injusto com os estudiosos e muito mais injusto com os vagais. Aqueles, ainda que não vejam valorizado o esforço e afrouxem o denodo, adquirirão bens culturais suficientes à emancipação; esses, acreditando que são capazes porque a escola os avaliou como iguais aos que estudam, seguirão incapazes de entender os versos do Geraldo Vandré em Disparada, ao dizer que na boiada já foi boi, mas um dia se montou e percebeu que gado é tangido, mas com gente é diferente.

A "generosidade" de considerar todos como divinos, maravilhosos, se convola em estelionato na aspereza da vida e os alunos preguiçosos, fracos, desinteressados são vítimas, não beneficiários dessa ideologia que faz do sistema educacional uma espécie de ilha da fantasia, onde passam o tempo sem se tornarem aptos a potencializar as qualidades e a superar os defeitos.

Ideário aderente à realidade é condição primeira para que os resultados dos brasileiros nos testes internacionais, a exemplo do Pisa, melhorem. É preciso que o sentimento de vergonha mobilize a ação para sentir o prazer do orgulho pelo sucesso.

Basta de pôr a culpa nos outros, no sistema, na sociedade.

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