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A Venezuela está há dez anos sob o mando de Hugo Chávez. A "revolução bolivariana" prometeu o paraíso e entregou apagão, racionamento de leite, água, ovos, víveres etc. A inflação ascendente contrasta com a economia estável que sempre distinguiu a Venezuela dos outros países latino-americanos. As últimas novidades foram a criação de valores diferentes para o câmbio da moeda local e o fechamento de lojas que remarcaram preços. Chávez, por óbvio, atribui os desarranjos econômicos aos governos anteriores e à cobiça dos especuladores. No seu primitivismo estatizante é incapaz de compreender as relações anárquicas da economia de mercado e o papel de fomento e regulação do Estado. Militar, o esquerdismo de Chávez é calcado no maniqueísmo do bem e do mal, do contra ou a favor do governo.

Em ambiente de concorrência perfeita, a formação dos preços ocorre em distribuição horizontal de poder. Em outras palavras, vendedores e compradores são igualmente poderosos. Nessa situação ideal o poder político também se ho­­rizon­­ta­­li­­za, acompanhando o po­­der econômico. Por certo, na dinâmica complexa das economias a concorrência pode ser vigorosa, débil ou inexistente. As relações de poder político podem ser a causa ou a conse­­quên­­cia dessas características da concorrência econômica. Por decisão política se pode reduzir ou suprimir a concorrência. Há atividades econômicas que são, por natureza, concentradoras de poder: petróleo, mineração, química fina, aeroespacial. São empreendimentos que exigem aportes gigantes de capital ou quando alguém ocupa o espaço, outrem não pode ocupar ao mesmo tempo. Basta pensar que ne­­nhum indivíduo, com poupança do­­més­­tica, concorrerá com a Em­­­­braer ou extrairá minério de ferro da mesma jazida explorada pela Vale.

Quando as circunstâncias fáticas inibem ou inviabilizam a concorrência, ocorre concentração de poder econômico e o poder político, tal qual a luz diante de massa intensamente gravitacional, fica susceptível à distorção se não houver decisão de estabelecer meios de controle e atenuação dos efeitos nocivos da concentração. Montesquieu pensou o tema exclusivamente com foco no poder político, ao propor o mecanismo da tripartição de órgãos dotados do poder político soberano. Porém as sociedades modernas têm as relações econômicas e ideológicas compondo o mix de poder.

Para adjetivar uma sociedade de tirânica ou democrática é necessário conhecer o grau de concentração ou difusão do poder político, econômico e ideológico. A democracia se afina com o poder difuso (muitos são detentores de poder); a tirania se afina com o poder concentrado (poucos ou apenas um detendo poder). Chávez, ao se tornar onipresente nos meios de comunicação, concentrou poder ideológico (capacidade e meios de convencimento); ao esmagar opositores, concentrou poder político; ao suprimir, manu militari, a concorrência comercial em atividades nas quais ela é objetivamente possível, concentrou ainda mais o poder econômico nas mãos do Estado (leia-se: suas próprias mãos, vez que ele e o Estado se confundem). A altíssima concentração de poder já ocorrida aproximou o regime político da Venezuela do paradigma tirânico.

Existem tiranos ricos; as sociedades submetidas à tirania são pobres. Não existe nenhuma sociedade rica com regime político distante da democracia. O tirano faz o que lhe dá na veneta, mas isso tem custo institucional altíssimo, a ser pago por gerações que conviverão com a cultura da insegurança jurídica, da fragilidade da palavra dada em contrato, do estigma à iniciativa particular, com a indolência pueril da dependência em relação ao pai provedor dos preguiçosos. A cena dos soldados fechando lojas é só mais uma dos atos monótonos, de tão previsíveis, do script da tirania chavista. Ainda bem que escapamos dessa trajetória ao nos horrorizarmos diante da cena dantesca dos policiais federais lançando bois porque o fazendeiro não os queria vender durante o plano cruzado, em 1986.

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