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O cidadão brasileiro que lê jornais, assiste televisão ou ouve rádio está aturdido. Vai tomando conhecimento da diabólica trindade que contamina a atuação do governo do presidente Lula da Silva e exaure suas energias vitais: corrupção, desperdício e incompetência.

A corrupção, a cada dia mais evidente, exposta pela mídia, está sendo investigada por múltiplas Comissões Parlamentares de Inquérito-CPIs. Suas criações foram represadas por longo tempo, até que, tanto se avolumaram os escândalos, não mais contida a sua divulgação, que em avalanche provocaram as instalações de CPIs em série.

Não há fronteiras separando as catástrofes que compõem essa diabólica trindade. Elas se confundem, uma propiciando o prosperamento da outra.

O desnudamento da corrupção vai continuar por muito tempo a ocupar as manchetes diárias da mídia. Agora, cumpre denunciar um outro componente dessa diabólica trindade – a incompetência.

A Medida Provisória n.º 258, de 21 de julho de 2005, constitui execrável exemplo dessa calamidade que vai desconstituindo a estruturação de instituição fundamental ao Estado Nacional. Ela trata da fusão da tradicional Secretaria da Receita Federal com a debutante Secretaria da Receita Previdenciária, que, recentemente criada, já está sendo eliminada nessa fusão precipitada, leviana, primária, oportunista, imprudente, em servidão às orientações do Fundo Monetário Nacional.

A denominação da nova instituição – Receita Federal do Brasil – é ridícula e tola, e revela desconhecimento da nossa estruturação constitucional. O Brasil não é um país imperialista. Então, não há por que se mencionar na sua denominação que a instituição é do Brasil, e não da Argentina, por exemplo, outro associado do Mercosul. Não se denomina Ministério da Fazenda do Brasil, ou Polícia Federal do Brasil. A referência ao Brasil já está subentendida na denominação federal, por ser instituição da União, que compõe a estrutura do Estado Nacional.

Talvez se quisesse não suscitar melindes da desaparecida debutante Secretaria da Receita Previdenciária, não a incorporando simplesmente à Secretaria da Receita Federal.

Os comerciantes conhecem o valor do nome, da fama, da imagem, da tradição, do símbolo, da clientela que compõem o conjunto de bens intangíveis do seu patrimônio. Construída, paulatinamente, nos quase cinqüenta anos de existência, a Receita Federal desaparece com novo título, por meio dessa medida provisória precipitada e inconstitucional.

Instituição estratégica ao Estado Nacional, pois lhe fornece os meios para financiar suas atividades, alterações significativas na sua estruturação não são dotadas de urgência, mas decorrem de estudada, discutida e planejada implantação. Medida Provisória constitui, constitucionalmente, providência inidônea para criar tal instituição, por lhe faltar o requisito de urgência. Deve ser produto de projeto de lei, que resulte de profunda análise e planejamento a ser realizado no âmbito dos órgãos envolvidos, examinados pelo Congresso Nacional, única instituição apta e legítima a definir a formatação de instituição vital e estratégica à operação do Estado Nacional.

Tratar simploriamente essa fusão como foi feito, provocará disfunções que podem comprometer a operação das funções elementares de administração tributária – o trato à informação, a fiscalização, arrecadação, orientação jurídica e julgamento dos processos. Matéria significativa como capacitação dos funcionários por treinamento, articulação e congregação dos sistemas informatizados, nada disso é abordado com a necessária explicitude e segurança. A falta de definição clara dos direitos e garantias dos servidores a serem incorporados à nova instituição podem provocar perplexidades, incompreensões, e, pior, resistências, materializadas em greves de protesto pela abrupta criação.

O que poderia ser justificado como produto da racionalidade institucional, posto que é elementar que os impostos, contribuições e taxas operam sobre uma realidade econômica unitária na sua origem, termina sendo perdido, pela forma como se realiza essa fusão, feita com incompetência, ressalte-se, evidente na sua inconstitucionalidade, imprudência, oportunismo, precariedade e manifestação de subserviência ao FMI.

O Congresso Nacional, onde essa matéria necessariamente será debatida, terá atuação decisiva no exame dessa medida provisória. Melhor seria devolvê-la ao Poder Executivo para que, após estudo sério e responsável, a encaminhasse como projeto de lei. A pressa e improvisação não são boas inspirações para tratar instituição fundamental ao Estado Nacional.

Osíris de Azevedo Lopes Filho é advogado, professor de Direito na Universidade de Brasília – UnB e Fundação Getúlio Vargas – FGV e ex-secretário da Receita Federal.

osirisfilho@azevedolopes.adv.br

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