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A vitória de Hugo Chávez na eleição venezuelana lhe acrescentará mais seis anos de mandato – ao fim, já serão 20 anos de governo chavista. Recordo de um encontro que tive com o então embaixador do Canadá no Brasil, quando eu presidia a OAB em uma época que as relações entre Venezuela e Canadá estavam esgarçadas. Afirmava o embaixador que a maré populista na América do Sul, segundo estudos do governo de seu país, iria durar duas décadas. A estimativa, ao que parece, começa a se concretizar.

O comparecimento maciço às urnas por parte do povo da Venezuela (mais de 80%) e a expressiva votação de Henrique Capriles, além do clima eleitoral que a oposição a Chávez ousou praticar, mostrando as mazelas do governo e os planos que tinham para o desenvolvimento do país, demonstram que, no novo mandato, Chávez encontrará a Venezuela modificada. Impossível que fique inerte ao fato de que quase metade de seus governados pretende e tem esperanças de que as coisas mudem em sua pátria; que haja reparação pelos absurdos erros cometidos por Chávez até agora ao aplicar um governo forte, autoritário e conflituoso.

Essa metade do país pede um basta ao gigantismo do setor público, que subjugou o privado, resultando em grande conflito social e na insegurança jurídica para investimentos no país. O venezuelano consciente e que produz e recolhe impostos não suporta mais a alta taxa inflacionária, que foi de 27,9% em 2011; metade dos empregos são informais, demonstrando o descalabro administrativo da Venezuela – Caracas é a mais violenta das capitais da América do Sul.

Tenho para mim que o modo de governar de Chávez – populista e clientelista da miséria de seu povo, apesar da abundância de recursos naturais do petróleo – é de uma tirania e truculência que guarda simetria muito próxima a regimes totalitários. Chávez transformou a nação em um país dividido politicamente. As práticas com fins eleitorais derivadas dos programas sociais – as misiones – são um crime de lesa-pátria, pois consomem os recursos da venda do petróleo para manter viva e a seu lado a miséria do povo, pouco se importando pelo progresso do país.

Chávez quebrou o princípio federativo do equilíbrio e harmonia dos poderes, subjugando Legislativo e Judiciário ao Executivo. Impôs mordaça à imprensa, fechou emissoras de rádio e televisão e atacou a imprensa escrita; afastou dirigentes e nomeou uma junta diretiva no Colégio dos Advogados da Venezuela, instituição semelhante à nossa OAB.

Na área internacional, aliou-se ao atraso dos regimes políticos que dominam Irã, Cuba e Síria; despertou na América do Sul regimes autoritários como os do Equador, Bolívia e Argentina; criticou os que não trilhavam sua ideologia, como México e Colômbia (ambos, ao lado do Brasil, os que mais cresceram na região nas duas últimas décadas), sem falar do péssimo relacionamento com os Estados Unidos e a União Europeia, chegando ao ridículo de ser admoestado pelo rei da Espanha, Juan Carlos, no célebre episódio do "por que não te calas?". Foi, ao lado de Kadafi (seu grande amigo) e Berlusconi, um grande bufão.

Por tudo isso, lamento as quase duas décadas perdidas pela Venezuela e lembro que o voto não absolve todos esses pecados. Que Chávez tenha a sensibilidade de ouvir o rumor das ruas e das urnas e faça destes seis anos os que modifiquem para melhor a realidade destas duas décadas.

Roberto Antonio Busato, advogado, foi presidente nacional da OAB (2004 a 2007).

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