Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados.| Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados
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O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), deu a entender que, enquanto durar o surto de coronavírus no Brasil, não há como votar as reformas. “Reformas são importantes no médio e no longo prazo, no curto é a vida das pessoas”, afirmou, acrescentando que “fixação em meta fiscal com o tsunami que teremos é não ter a cabeça no lugar”. De acordo com o parlamentar, a comissão especial da reforma tributária deve continuar trabalhando por videoconferência, mas as propostas de emenda constitucional do Programa Mais Brasil – PEC dos Fundos, PEC Emergencial e PEC do Pacto Federativo – terão de esperar. O foco exclusivo no urgente enquanto se descuida do importante pode custar tempo e recursos preciosos para o país.

Maia, de alguma forma, expressa o equívoco inverso ao que Paulo Guedes vinha exibindo até tempos atrás. No dia em que a disputa entre Rússia e Arábia Saudita derrubou os preços do petróleo e a bolsa de valores paulistana acionou o circuit breaker pela primeira vez desde 2017, o ministro da Economia insistiu na tranquilidade e no discurso em defesa da aprovação das reformas como prioridade. Felizmente, Guedes percebeu o tamanho do caos em que o coronavírus lançará as economias nacionais – inclusive a brasileira –, já anunciou várias medidas e está trabalhando em outras. Maia inverte o sinal e cria uma falsa dicotomia: ou o Congresso cuida do coronavírus, ou analisa as reformas, como se fosse impossível conciliar ambas as necessidades.

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Se as reformas já eram necessárias quando o Brasil pensava em engatar uma recuperação, sua importância apenas aumenta nas circunstâncias atuais

O Guedes da semana passada avaliava mal o impacto do coronavírus, mas tinha razão no ponto central do seu argumento. Quando todo esse furacão passar (porque irá passar, mais cedo ou mais tarde), em que país preferiremos estar, em um que realizou reformas para dar maior racionalidade ao sistema tributário e que permitirão maior flexibilidade ao poder público em tempos ruins, ou em um que manteve todas essas estruturas engessadas e a loucura tributária nacional? Em qual desses países a recuperação da economia estaria facilitada? Basta imaginar, por exemplo, o que poderia estar ocorrendo caso o Brasil já tivesse aprovado, alguns anos atrás, uma regra semelhante à proposta hoje na PEC dos Fundos (que está pronta para ser votada no plenário do Senado, aliás): o combate ao coronavírus e o reforço da estrutura hospitalar talvez pudessem contar com mais alguns bilhões de reais hoje parados em algum fundo infraconstitucional.

Se o Congresso estivesse disposto a seguir com a tramitação das reformas, poderia adotar um cronograma bastante simples: enquanto houver no Legislativo projetos de lei e medidas provisórias relativas ao combate à pandemia, elas terão prioridade – caso o Senado aprove na sexta-feira o estado de calamidade pública, por exemplo, o Congresso passará a receber MPs que abrirão crédito suplementar para gastos do governo. Mas, na ausência de textos relativos a esse tema, as reformas voltariam a ocupar o primeiro lugar na pauta.

Passar as reformas na frente de medidas de combate ao coronavírus e a seus efeitos na economia é “não ter a cabeça no lugar”, mas é igualmente insensato se esquecer de que o médio e longo prazo também precisam estar no radar do Poder Legislativo e que é preciso dar meios para o país se recuperar mais rapidamente da crise que o coronavírus legará ao país. Se as reformas já eram necessárias quando o Brasil pensava em engatar uma recuperação, sua importância apenas aumenta nas circunstâncias atuais. O Congresso não pode cair em uma armadilha retórica; a atenção ao coronavírus e as reformas não têm nada de excludentes.