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O déficit fiscal consolidado do setor público em março, que inclui o saldo das contas dos municípios, dos estados, da União e das empresas estatais, foi o pior resultado deste mês nos últimos nove anos. O déficit do primeiro trimestre do ano seguiu a mesma toada e foi o pior da série, mostrando que o governo, em todos os níveis, resolveu relaxar (no sen­­­­tido negativo da palavra) a gestão financeira. Coin­­ci­­dência ou não, 2010 é um ano de eleições, época em que os governantes costumam gastar demais, piorando as contas públicas. É uma péssima notícia para a economia, pois as consequências no médio e no longo prazos são desastrosas. E, para agravar a situação, tem havido pressões para que o governo edite medida pro­­visória destina­­da a flexibilizar a Lei de Responsabilidade Fiscal. Ou seja, por essa medida ficariam livres de punições os governantes que gastassem acima dos tetos permitidos na lei, sobretudo os gastos com pessoal.

Quando o governo gasta mais do que arrecada, as pessoas e as empresas devem gastar menos do que sua renda, para emprestar sua poupança ao governo. Se isso não ocorrer, o país tem de complementar os recursos do governo buscando capitais no mercado internacional. Essa é uma das principais razões pelas quais o Banco Cen­­tral (BC) eleva a taxa de juros, como meio de estimular a entrada de dinheiro estrangeiro no Brasil. Ao elevar a ta­­xa de juros, o BC contribui para a entrada de recursos des­­tinados a cobrir o déficit fiscal, de um lado, e cria um problema para o tesouro público, de outro, pois provoca elevação dos gastos do governo com despesas financeiras, que aumentam em função da maior taxa de juros pagas nos títulos públicos emitidos com a nova taxa.

Além desses efeitos, a elevação da taxa de juros empobrece as pessoas e as empresas, pelo encarecimento das linhas crédito para consumo e para investimentos privados. Mas as opções do BC nunca são fáceis. Se ele não elevar a taxa de juros, o país passa a depender do ingresso de capitais externos para fechar as contas nacionais e, pe­­lo fato de o governo gastar mais do que arrecada, a in­­flação é pressionada para cima. A pressão inflacionária ocorre porque a chamada "demanda agregada" (que é a demanda das pessoas, das empresas, do governo e do res­­to do mundo sobre a produção brasileira) se estabelece em patamar superior à oferta. Isto é, não existe produção suficiente para atender a toda a procura por bens e serviços.

O susto que o déficit público e a piora das contas públicas no primeiro trimestre deste ano deram certamente ajudaram na decisão do BC em elevar a taxa de juros. Os gastos não financeiros do governo (que exclui o pagamento de juros da dívida) nos três primeiros meses de 2010 subiram 13,8% em comparação com o mesmo pe­­ríodo do ano passado. Mesmo que o Produto Interno Bruto (PIB) tenha crescido 6% nesse mesmo período, o crescimento real dos gastos do governo foi grande demais. Assim, na reunião do fim de abril, o Conselho de Política Monetária (Copom) elevou a taxa básica de juros de 8,75% para 9,5% ao ano, como resposta à soma dos fatores já referidos e aos sinais indicando a subida da inflação.

O controle da inflação foi uma conquista da sociedade brasileira, a partir de 1994, e já está incorporado na cultura nacional como algo a ser mantido e defendido contra ameaças de rompimento. Por mais que alguns críticos do BC gritem, cabe a ele agir diante de qualquer ameaça de aumento da inflação, pois seus efeitos no empobrecimento nacional é conhecido da população. A maior reclamação dos críticos é que a elevação da taxa de juros é um balde de água fria no crescimento econômico, como se o BC não gostasse de ver o país crescendo. O pro­­blema pouco divulgado é que um aumento na demanda agregada que não crie expansão na oferta (produção) provoca apenas uma coisa: elevação dos preços, ou seja, mais inflação. O crescimento da riqueza de um país se dá na medida em que a oferta responde a estímulos vindos do aumento do consumo e do investimento. Se a oferta não responder, o resultado será apenas mais inflação, mais pobreza e toda a desorganização do sistema produtivo que a inflação provoca.

Por seu lado, a expansão nos gastos públicos que não seja acompanhada de aumento do PIB e aumento da arrecadação provoca elevação da dívida do governo, que já anda na faixa de R$ 1,5 trilhão e exige elevado dispêndio com pagamento de juros. O ritmo de crescimento dessa dívida deriva do tamanho do déficit público, o qual pode fazer a dívida crescer em porcentual maior do que o porcentual de crescimento do PIB. Se isso ocorrer, a sociedade terá de pagar a fatura nos anos seguintes. Ir por esse caminho não é um bom negócio, e a população deve ser esclarecida a respeito, entre outras razões para não aceitar demagogias e pressionar os governantes a somente gastarem o que podem. Portanto, antes de criticar o BC porque elevou a taxa de juros, é preciso criticar o governo, que elevou seus gastos.

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