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Quatro governadores venceram de virada as eleições no segundo turno
| Foto: Antonio Augusto/Ascom/TSE

Um dos clichês da sabedoria política nacional diz que o primeiro turno é o do “voto por convicção” e o segundo turno, do “voto de rejeição”. Como todos os clichês, ele tem boa dose de exagero, mas também contém algumas verdades, especialmente no caso de uma eleição altamente polarizada entre duas figuras que despertam paixão e repulsa em níveis que outros políticos não chegam a despertar. Entender o voto nesta eleição presidencial de 2022 é um exercício necessário e que ajuda a compreender as reais necessidades do país, e como sua classe política pode colaborar para que tais necessidades sejam satisfeitas.

Neste primeiro turno em que os dois principais candidatos romperam a barreira dos 40% dos votos válidos, deixando uma parcela pequena da preferência popular para a chamada “terceira via”, percebe-se que o eleitor não votou guiado apenas pela convicção – a rejeição já cumpria um papel importante. A estratégia do voto útil, difundida especialmente pelo petismo, baseou-se não nas eventuais virtudes de Lula, mas em uma necessidade de derrotar Jair Bolsonaro o quanto antes, para não se correr riscos no segundo turno. Da mesma forma, ao menos parte da votação do atual presidente da República em 2 de outubro foi motivada mais pelo antipetismo que por algum entusiasmo em relação à figura de Bolsonaro.

Ainda nos falta um líder que não apenas seja capaz de defender aquelas pautas que ajudarão o Brasil a evoluir como nação, mas também que saiba fazê-lo agregando, e não dividindo

Mas é este acirradíssimo segundo turno que merece um olhar mais atento. Em comparação com 2018, tanto a abstenção quanto os votos brancos e nulos tiveram queda, mostrando que mais eleitores foram motivados a escolher um dos candidatos em vez de afirmar que nenhum deles merecia seu voto. Certamente não são poucos, por exemplo, os que têm consciência dos defeitos de Bolsonaro, que são reais: sua tendência ao confronto mesmo quando o diálogo era possível, as manifestações de falta de empatia durante a pandemia, as insinuações antidemocráticas, a aproximação com o Centrão, nomeações infelizes para a PGR e o STF. Esses eleitores, no entanto, em vez de anular o voto, consideraram que o petismo oferecia um risco tão maior à nação em termos de pauta moral, políticas econômicas e respeito à democracia que valeria a pena votar em Bolsonaro para impedir a vitória de Lula. Esta é uma avaliação que também compartilhamos, embora infelizmente não tenha prevalecido nas urnas.

No entanto, o contrário também ocorreu, e isso exige uma reflexão. Pessoas que têm consciência do que Lula e o petismo foram e são, que conhecem os esquemas de corrupção que o partido montou para fraudar nossa democracia, que sabem do apreço do PT por ditaduras e que viveram a crise econômica legada pela “nova matriz econômica” votaram no petista, em vez de se absterem, por considerarem que Bolsonaro era um mal maior; Lula jamais teria conseguido vencer sem o voto dessas pessoas. Isso nos mostra que ainda nos falta um líder que não apenas seja capaz de defender aquelas pautas que ajudarão o Brasil a evoluir como nação – respeito às liberdades democráticas, defesa da vida e da família, liberdade econômica, firmeza no combate à corrupção e à criminalidade –, mas também que saiba fazê-lo agregando, e não dividindo. Que aposte no diálogo, e não em um estado permanente de conflito. Bolsonaro falhou neste quesito e, com isso, afastou de si muitos que, mesmo apresentando discordâncias pontuais, poderiam tê-lo ajudado a implementar seu programa e a conquistar a reeleição.

Esta é uma autocrítica que tem de ser feita por todos os que compartilham deste ideário que ajudou a eleger Bolsonaro em 2018, mas que não bastou para repetir o feito em 2022. O belicismo serve para manter a militância mobilizada, mas tem pouquíssimo resultado fora da bolha. Um bom líder, disposto a fazer o melhor pelo Brasil, certamente encontrará uma oposição radical refratária a qualquer diálogo, mas existe toda uma parcela moderada da sociedade e da classe política que está disposta a ouvir argumentos, ainda que não termine concordando com eles. Ignorar essa parcela ou, pior ainda, tratá-la como adversária apenas por não se aliar incondicionalmente a certo partido ou político é receita certa para alienar milhões de brasileiros.

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