Um dos pilares que permitiram a eleição de Jair Bolsonaro em 2018 foi o discurso firme em relação ao caos que o Brasil vive na área de segurança pública. O país vinha de um recorde de homicídios em 2017, com 65,6 mil mortes segundo o Atlas da Violência, ou 63,9 mil de acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Esta mesma entidade acaba de divulgar seus dados referentes ao ano passado, ainda sob o governo de Michel Temer, e traz uma boa notícia, uma queda de 10,4% nos assassinatos, que somaram 57,3 mil. E a tendência de queda tem se mantido neste ano – em meados de agosto, o Ministério da Justiça divulgou números do Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública (Sinesp), apontando que nos primeiros quatro meses de 2019 os homicídios caíram mais 21% na comparação com o mesmo período de 2018.
Os números, por certo, continuam escandalosos. A taxa de 27,5 homicídios para cada 100 mil habitantes é muito superior às médias do continente americano e mundial – respectivamente, 17,2 e 6,1, de acordo com o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC). Proporcionalmente, mata-se muito mais no Brasil que em zonas de guerra civil aberta, como a Síria. Apenas um estado brasileiro, São Paulo, tem taxas abaixo das recomendadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS), que estipula como limite aceitável 10 mortes para cada 100 mil habitantes. Isso quer dizer que ainda há muito trabalho a ser feito, mas as reduções recentes mostram que o país está no caminho certo.
Nossos números continuam escandalosos e ainda há muito trabalho a ser feito, mas as reduções recentes mostram que o país está no caminho certo
E os fatores que levam à redução na taxa de homicídios são variados. As análises que promovem excessivamente determinados agentes ou simplesmente anulam a importância de outros, seja por limitações metodológicas ou por conveniência política, prejudicam uma visão mais ampla do fenômeno da redução da violência no país. Por mais desagradável que seja, por exemplo, é preciso reconhecer que as grandes facções criminosas têm sua influência nos números dos homicídios, que recuam quando há acomodação de forças entre os grupos. Isso não significa, no entanto, que o papel dos governos no combate à violência seja secundário na redução das taxas de assassinatos.
E, ainda que a segurança pública seja atribuição principal dos governos estaduais, no passado recente o governo federal tem tomado várias iniciativas para reduzir os índices de criminalidade. As parcerias entre União e estados ganharam força durante o fim do mandato de Michel Temer, com Raul Jungmann à frente do Ministério da Segurança Pública, e continuaram após a posse de Bolsonaro na Presidência e do ex-juiz Sergio Moro no Ministério da Justiça, que absorveu a pasta da Segurança. Um caso exemplar de parceria entre os entes federativos ocorreu em fevereiro, quando chefões do PCC – incluindo Marcola, o líder máximo da facção – foram transferidos para presídios federais espalhados pelo país. Em entrevista à Gazeta do Povo, o general Guilherme Theophilo, secretário nacional de Segurança Pública, comemorou a desarticulação das cúpulas dos maiores grupos criminosos do país, e não se esquivou de citar Altamira (PA), cenário da mais recente barbárie entre presos e prova de que o trabalho de combater as facções dentro do sistema prisional ainda não está concluído.
Um país seguro, no entanto, não se faz apenas reduzindo as taxas de homicídios. Ainda que o crime contra a vida seja o mais grave de todos, a sensação de insegurança permanece quando o cidadão sai à rua com medo de assaltos ou sequestros-relâmpago, ou quando as mulheres correm grande risco de serem estupradas. Os números do Sinesp, felizmente, também apontam redução nestes outros crimes no primeiro quadrimestre de 2019, na comparação com 2018: os estupros caíram 13,6%; os furtos de veículos, 11,1%; e os roubos de veículos, 27,5%. Em agosto, Bolsonaro e Moro lançaram o programa Em Frente Brasil, de combate ao crime violento, e as cinco cidades escolhidas para o piloto também registraram queda nos índices de criminalidade depois que as forças-tarefa começaram a atuar.
Estas são apenas algumas das ações necessárias para resolver uma situação construída ao longo de décadas de descaso, leis equivocadas e ideologias coniventes com a bandidagem. Drogas e armas entram pelos milhares de quilômetros de fronteiras porosas; a falta de estrutura para a investigação leva a índices medíocres de resolução de crimes, resultando na impunidade dos criminosos; os que têm o azar de serem identificados e presos contam com os favores de uma legislação frouxa, com progressões de pena facilitadas, “saidinhas”, indultos e outros dispositivos que fazem das penas estabelecidas no Código Penal peça de ficção. Mesmo assim, ideólogos continuam afirmando que no Brasil “prende-se demais” e que propostas de endurecimento no combate ao crime são “punitivistas”, quando não são motivadas por um obscuro desejo de promover “genocídios”.
O trabalho é hercúleo e exige inúmeras frentes e trabalho conjunto de governo federal, governos estaduais e Poder Legislativo. Programas bem sucedidos, como o pernambucano Pacto Pela Vida, precisam ser mantidos e replicados; se iniciativas federais como o Em Frente Brasil continuarem mostrando bons resultados, devem ser ampliadas; projetos como o pacote anticrime de Sergio Moro não podem ser destruídos no Congresso. É preciso dar bases sólidas ao esforço de combate à violência, para não corrermos o risco de os avanços registrados até o momento serem apenas efêmeros.