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Foi aberto ontem pelo Conselho de Ética do Senado o processo disciplinar contra o senador Demóstenes Torres (sem partido) por quebra de decoro parlamentar. A decisão de instaurar o rito processante decorre das graves evidências de seu envolvimento com as negociatas do contraventor Carlinhos Cachoeira, um dos chefes do jogo ilegal no Brasil. O passo seguinte será o sorteio do relator para o caso, a quem caberá recomendar a absolvição ou a punição de Demóstenes, que pode variar de uma simples advertência à cassação do mandato.

Não poderia ser diferente a decisão do conselho do Senado em relação ao seu integrante, torpedeado em cheio na aura de um dos bastiões da moralidade política da Casa. As gritantes suspeitas de desvios éticos de conduta por parte de Demóstenes, que como num passe de mágica passou de herói a vilão, precisam ser aprofundadas. Afinal, são por demais comprometedoras as conversas gravadas entre o senador e o contraventor. Um conteúdo que mistura desde informações privilegiadas repassadas a Cachoeira, até acertos para a entrega ao senador de altas somas de dinheiro.

A abertura do processo contra Demóstenes Torres, que fique claro, é apenas a primeira etapa de um trabalho que pode ser longo e de desfecho imprevisível, diante dos seus inevitáveis desdobramentos políticos e jurídicos. Ainda que o Conselho de Ética recomende a cassação, a decisão final caberá ao plenário da Casa, em votação secreta, o que em tese favoreceria o acusado. Na esfera jurídica, o senador mira como estratégia conseguir a anulação dos indícios contra ele coletados pela Polícia Federal. Para tanto, a defesa sustentará a tese de que as gravações foram obtidas sem amparo legal, inviabilizando, portanto, seu emprego como prova.

Dono de invejável currículo – advogado, membro do Ministério Público de Goiás, ex-procurador-geral de Justiça e ex-secretário de Segurança Pública em seu estado – como político Demóstenes ganhou notoriedade nacional pela postura crítica contra os desmandos dos governos do PT. Um santo que revelou ter pés de barro diante do seu comprometimento com as falcatruas de Cachoeira. Egresso do DEM, de onde saiu para não ser expulso, o senador luta agora para manter o chamuscado mandato ou, em último caso, renunciar a ele para não perder os direitos políticos.

É importante salientar que o caso Demóstenes-Cachoeira revela de forma clara as relações espúrias que grassam no meio político brasileiro de forma endêmica. O senador goiano caiu na rede das atividades nada republicanas, mas ele não é o único a ter interesses ligados ao chefão do jogo. A proximidade de Cachoeira com o poder sabidamente é muito maior, compreendendo representantes de variadas matizes partidárias e de outras áreas do poder público.

Essa constatação por si só justifica a iniciativa de um grupo de senadores que está colhendo assinaturas para a instalação de uma CPI mista (Câmara e Senado). A finalidade será investigar não só o envolvimento de parlamentares, mas também de autoridades do Executivo com as atividades ilegais comandadas por Cachoeira. Vingando a CPI, pode ser a oportunidade para se começar a separar o joio do trigo, permitindo acabar com pelo menos uma rede de influência que age impunemente em várias instâncias da República há muito tempo.

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