Ninguém que tenha os dois pés na realidade espera que as eleições presidenciais venezuelanas de 2024 sejam livres e justas. O ditador Nicolás Maduro já conseguiu que a principal candidata da oposição, María Corina Machado, permaneça impedida de concorrer, e agora o chavismo corre para realizar as eleições o mais cedo possível para resolver logo a questão. No entanto, mesmo que o ditador já tenha dado inúmeras demonstrações de que o acordo assinado em Barbados, em outubro do ano passado, era apenas uma de suas chicanas para ganhar tempo, os norte-americanos ainda hesitam em fazer o certo e não deixar que Maduro continue se beneficiando de contrapartidas oferecidas por algo que o caudilho bolivariano não entregou.
Nesta quarta-feira, o assessor de Segurança Nacional da Casa Branca, Jake Sullivan, afirmou que o governo norte-americano esperará até abril para decidir o que fazer. “Essa decisão dependerá do que o presidente venezuelano, Nicolás Maduro, fizer até lá para cumprir seu compromisso de realizar eleições livres e justas este ano”, disse Sullivan, acrescentando que “as licenças que concedemos para o alívio das sanções expiram em abril. Nesse momento, veremos em que pé estamos com relação ao regime de Maduro e se ele está cumprindo seus compromissos, e então tomaremos nossas decisões sobre como proceder a partir daí”. Sullivan, na verdade, estava apenas repetindo o que o porta-voz do Departamento de Estado, Matthew Miller, havia dito no fim de janeiro ao afirmar que “o alívio para os setores de petróleo e gás da Venezuela será renovado em abril somente se os representantes de Maduro cumprirem seus compromissos”.
Maduro já não merece nenhum voto de confiança: ele não fez nenhum movimento no sentido de permitir eleições livres e limpas, e em vez disso trabalha ativamente para sufocar a oposição
Este apego aos prazos não tem lógica alguma. Primeiro, porque Maduro já não merece nenhum voto de confiança: ele não fez nenhum movimento no sentido de permitir eleições livres e limpas, e em vez disso trabalha ativamente para sufocar a oposição, por meio de decisões de um Judiciário totalmente aparelhado. Segundo, porque os Estados Unidos até responderam à confirmação da inabilitação de María Corina, mas restabeleceram apenas as sanções sobre o setor de ouro. Ora, se a medida norte-americana é um reconhecimento de que Maduro não cumpriu sua parte do acordo, que sentido faria esperar até abril para retomar todas as sanções, deixando intacto até lá o setor de petróleo, muito mais importante para a economia venezuelana?
A confirmação do veto ao nome de María Corina como candidata legítima da oposição despertou reação em outros países – o Brasil de Lula, vergonhosamente, preferiu criticar a retomada parcial das sanções norte-americanas –, blocos e organizações internacionais. O Parlamento Europeu, por exemplo, prometeu não reconhecer o resultado da eleição caso María Corina não possa concorrer. No entanto, é preciso lembrar que a União Europeia (da qual o Parlamento Europeu é o braço legislativo) já abandonou os líderes democráticos venezuelanos uma vez: a UE chegou a reconhecer Juan Guaidó como presidente legítimo da Venezuela em 2019, mas retirou esse reconhecimento em 2021, após os deputados eleitos para a Assembleia Nacional em 2015 prorrogarem os próprios mandatos em resposta a uma eleição legislativa fraudulenta que teve “vitória” chavista.
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Eis o drama da população venezuelana: desarmada e enfraquecida, ela depende da pressão internacional para que Maduro comece a agir em sentido contrário ao seu impulso de consolidar o próprio poder. As democracias do Ocidente, no entanto, agem com hesitação, enquanto as autocracias mundo afora não pensam duas vezes antes de ajudarem-se umas às outras, inclusive trabalhando para contornar sanções econômicas. Maduro já quebrou o acordo de Barbados, e cada dia em que a Casa Branca permita ao setor petrolífero venezuelano seguir fazendo negócios com os Estados Unidos é um dia em que a ditadura se fortalece. Nesse ritmo, os chavistas poderão descrever suas eleições da mesma forma como os russos se referiram ao próprio pleito presidencial, marcado para março: uma “burocracia cara” com vencedor pré-definido.
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