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O julgamento de políticos no Brasil chegou ao ápice da ineficácia na semana passada, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) apreciou a ação penal envolvendo os deputados federais paranaenses Alceni Guerra (DEM) e Fernando Giacobo (PR). Os dois eram acusados de irregularidades na licitação de concessão da rodoviária de Pato Branco, em 1998. Como são deputados, possuem foro privilegiado ou, em uma linguagem mais técnica e branda, "foro por prerrogativa de função". Trata-se da previsão constitucional de que determinadas autoridades – do Executivo, do Legislativo e do Judiciário –, em caso de crime comum ou de responsabilidade, não sejam processadas e julgadas por um magistrado de primeira instância, mas sim por um tribunal.

Pois bem, na sessão do julgamento dos dois políticos paranaenses na semana passada, cinco ministros decidiram pela absolvição, outros cinco, pela condenação, mas, como Eros Grau estava ausente, a decisão foi adiada para esta semana. No dia seguinte, porém, o processo prescreveu. O julgamento deve continuar, quando Eros Grau irá se manifestar, mas terá caráter apenas simbólico, o que significa que, mesmo que os acusados sejam condenados, não cumprirão pena.

A conclusão que se tira do episódio é a de que o foro privilegiado tornou o julgamento de políticos uma encenação teatral. Chamar de encenação um caso como esse não é exagerar no uso da linguagem. Um julgamento que termina empatado por falta de um juiz, é adiado, mas, no dia seguinte, já não vale mais torna a Justiça uma peça de ficção. Pela legislação, em questões penais, deputados federais, senadores, ministros, o procurador-geral da República e o presidente têm direito ao foro privilegiado no STF. Prefeitos são julgados pelos Tribunais de Justiça dos estados. Governadores e desembargadores, pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).

O episódio envolvendo os deputados paranaenses demonstra também a incapacidade de julgar de um tribunal e que o papel do STF precisa ser urgentemente revisto.

E não apenas isso. O número de processos tramitando em tribunais, sob o fundamento da prerrogativa de função, cresce de forma absolutamente assustadora, em progressões geométricas. E o Supremo tem também dificuldade de conduzir a instrução dos processos.

Levantamento da Corte divulgado em 2009 mostrou que, desde 2004, somente 11 autoridades foram julgadas pelo STF. E dada essa dificuldade, os processos vão se acumulando. Atualmente o STF tem cerca de 7 mil processos criminais envolvendo deputados, senadores e ministros tramitando na Corte. A demora para processar políticos é tamanha que é comum o mandato dos parlamentares acabar antes de irem a julgado. Quando isso acontece, o processo é encaminhado para a Justiça comum.

Assim, independentemente da posição que se adote acerca da conveniência ou não da manutenção do "foro privilegiado", o que parece ser consenso é o fato de que os tribunais do país não estão suficientemente estruturados para absorver o processamento de inquéritos e de ações penais calcados nessa prerrogativa. Falta-lhes estrutura. Não faz parte da rotina dos tribunais a instrução processual. Não faz parte da rotina das cortes, por exemplo, ouvir testemunhas e o depoimento das partes.

Ciente de sua falta de aptidão para realizar julgamentos, o STF está firmando uma parceria com a Polícia Federal com o fim de acelerar a investigação e o julgamento de autoridades com foro privilegiado. Para isso, o Supremo pretende mudar seu regimento interno, de modo que as regras de trâmite processual sejam mais objetivas, com o fim de que o julgamento ocorra em prazo razoável, evitando-se a prescrição.

Resta saber se as mudanças acenadas pelo STF irão surtir o efeito desejado, ou seja, acabar com a impunidade advinda do foro privilegiado que leva a processos que nunca chegam ao fim ou que simplesmente prescrevem, como no caso dos dois políticos paranaenses.

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