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Com o objetivo declarado de desenvolver a produção nacional do carro elétrico, o governo decidiu sobretaxar os importados.
Com o objetivo declarado de desenvolver a produção nacional do carro elétrico, o governo decidiu sobretaxar os importados.| Foto: Unsplash

Para um governo que se acostumou a fazer da mentira seu pão de cada dia, ao menos em um caso a sinceridade acabou prevalecendo, e dando uma mostra do equívoco da política industrial lulista. Ao anunciar a volta do Imposto de Importação para veículos elétricos e híbridos, cuja alíquota subirá gradativamente a partir de janeiro de 2024 até chegar a 35% em 2026, o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, não alegou a necessidade geral de elevar arrecadação para fechar as contas, nem a intenção de fazer os ricos pagarem mais impostos, já que carros elétricos ainda são um item para a classe média-alta: as razões são puramente protecionistas. “Temos de estimular a indústria nacional em direção a todas as rotas tecnológicas que promovam a descarbonização”, afirmou Alckmin no anúncio da reoneração.

O raciocínio é o mesmo de sempre: se o governo dificultar a concorrência externa, a indústria nacional se sentirá estimulada a realizar os investimentos que, de outra forma, não faria; assim, o mercado interno será abastecido com produtos locais em quantidade e qualidade semelhantes ou até maiores às de quando não vigoravam as medidas protecionistas. Este pensamento vai contra a lógica e contra a experiência histórica brasileira. Contra a lógica, porque é ingênuo acreditar que qualquer produtor de bens ou fornecedor de serviços, em qualquer área, se sentirá estimulado a investir e melhorar se não tiver um concorrente em seu encalço ou que ele tenha de superar.

Em vez de proteção contra a concorrência externa, o que a indústria precisa é de uma carga tributária menos escorchante, facilidade para transferência de tecnologia, mão de obra mais qualificada, liberdade econômica e remoção dos entraves que formam o “custo Brasil”

Além disso, se protecionismo realmente resultasse em avanço do parque doméstico, o Brasil hoje seria uma potência em vários ramos: teria, por exemplo, se tornado líder na produção de computadores durante a vigência da Lei de Informática, e nossos automóveis já estariam entre os melhores do mundo, dada a longa sequência de incentivos e subsídios às montadoras, concedidos por governos de todos os matizes ideológicos que já passaram pelo Palácio do Planalto. Em vez de estimular a inovação e o investimento pesado, o protecionismo termina gerando ineficiência, baixa produtividade e preços mais altos ao consumidor.

Estimular a indústria nacional é objetivo interessante, mas o meio que o Brasil tradicionalmente escolhe para alcançá-lo já se mostrou ineficaz. Em vez de proteção contra a concorrência externa, o que a indústria precisa é de uma carga tributária menos escorchante –  algo que a reforma tributária aparentemente não fará, mantendo tributação pesada sobre a produção e o consumo –, facilidade para transferência de tecnologia, mão de obra mais qualificada, liberdade econômica e remoção de todos os demais entraves que formam o “custo Brasil”, incluindo as deficiências de infraestrutura e logística.

Tudo isso, no entanto, demanda um esforço gigantesco e prolongado em várias frentes, e o protecionismo, em comparação, exige apenas uma canetada com efeitos quase imediatos. O mais provável é que, daqui a alguns anos, os brasileiros percebam que a produção nacional de veículos elétricos e híbridos não terá alcançado o volume, a qualidade e/ou o preço do produto cuja entrada o governo resolveu dificultar, perpetuando o ciclo vicioso que impede a indústria nacional de se desenvolver: tenta-se sanar as baixas produtividade e competitividade com subsídios e protecionismo, que por sua vez mantêm o setor pouco produtivo e pouco competitivo. É preciso romper este ciclo e atacar o problema da forma correta.

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