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A presidente da Câmara dos EUA, Nancy Pelosi, falando com a presidente de Taiwan, Tsai Ing-wen, durante uma coletiva de imprensa no Palácio Presidencial em Taipei, Taiwan, 3 de agosto de 2022.
A presidente da Câmara dos EUA, Nancy Pelosi, falando com a presidente de Taiwan, Tsai Ing-wen, durante uma coletiva de imprensa no Palácio Presidencial em Taipei, Taiwan, 3 de agosto de 2022.| Foto: EFE/EPA

A visita da presidente da Câmara dos Representantes norte-americana, Nancy Pelosi, a Taiwan, como parte de seu roteiro pela Ásia, dividiu opiniões dentro e fora dos Estados Unidos. Curiosamente, ela foi elogiada pelos adversários republicanos por demonstrar a solidariedade norte-americana à ilha asiática; já os correligionários democratas criticaram Pelosi por irritar o governo comunista de Pequim, que prometeu retaliações – e as críticas vieram apesar de a visita ter oferecido aos democratas um factoide que permite desviar a atenção do estado lastimável da economia norte-americana, vítima de uma estagflação que deve levar o eleitor a colocar os republicanos à frente das duas casas do Congresso nas eleições de novembro. No entanto, há muito mais na visita que meras considerações eleitorais.

Os tempos atuais, infelizmente, têm sido marcados pelo aumento da crença das superpotências em soluções de força. A própria China, em desrespeito claro ao acordo de devolução de Hong Kong, já aboliu o modelo de “um país, dois sistemas” que deveria vigorar até 2047, esmagando liberdades e impondo sobre o antigo enclave britânico a mesma ditadura à que submete todos os demais cidadãos. A repressão promovida por Pequim foi recebida com protestos da comunidade internacional, mas nada mais que isso. A Rússia, incapaz de aceitar que os ucranianos decidissem seu próprio destino e optassem por uma aproximação com o ocidente em vez de ficar na órbita de Moscou, invadiu a nação vizinha e vem conduzindo uma campanha militar brutal e desgastante, contando com o cansaço de norte-americanos e europeus, dependentes do gás russo.

Este é o momento de a comunidade internacional enviar uma mensagem inequívoca de que não tolerará aventuras imperialistas como a que está ocorrendo na Ucrânia e que poderia vir a ocorrer em Taiwan

A posição de Taiwan é muito mais frágil que a da Ucrânia, uma nação estabelecida, membro de pleno direito da comunidade internacional. Apenas pouco mais de uma dúzia de países reconhecem a República da China, nome oficial de Taiwan – o maior deles é o Paraguai. A maior parte do ocidente (incluindo os Estados Unidos) mantém relações informais com a ilha, enquanto reconhece formalmente a China comunista. A postura norte-americana ficou conhecida como “ambiguidade estratégica”: os EUA defendem o princípio de “Uma China”, mas não são claros sobre o que isso significa, e a expressão tem sentidos diferentes dependendo de quem a usa – para os comunistas chineses, por exemplo, ela descreve um único país sob o governo do Partido Comunista, e que inclui a “província rebelde” de Taiwan, que mais cedo ou mais tarde será submetida a Pequim, por bem ou por mal.

Críticos da visita de Pelosi, mesmo aqueles solidários a Taiwan, argumentaram que o momento escolhido não foi dos melhores, pois em breve o Partido Comunista Chinês realizará seu congresso, no qual Xi Jinping buscará um novo mandato, e o líder não pode demonstrar fraqueza em um tema tão crucial quanto o status de Taiwan às vésperas do momento de sua consagração como o governante comunista chinês mais forte depois de Mao Tse-tung e Deng Xiaoping. No entanto, nada indica que a posição de Xi esteja ameaçada caso ele não responda agressivamente à visita. E, a bem da verdade, se a questão é não irritar o Partido Comunista, nenhuma hora seria apropriada para se visitar Taiwan.

Mas a hora é totalmente apropriada para toda a comunidade internacional (e não apenas os Estados Unidos) enviar uma mensagem inequívoca de que não tolerará aventuras imperialistas como a que está ocorrendo na Ucrânia e que poderia vir a ocorrer em Taiwan. A China de 2022 não é a mesma dos anos 90 do século passado, quando ocorreu a mais recente Crise do Estreito de Taiwan: ela está mais poderosa e mais agressiva, e faz questão de demonstrá-lo não apenas em Hong Kong, mas também com todos os exercícios militares que faz nas proximidades da ilha, lançando mísseis e frequentemente violando o espaço aéreo e o mar territorial taiwaneses.

Por mais que o uso da via diplomática para dissuadir a China e o envio de ajuda militar a Taiwan para que seja capaz de responder a uma agressão chinesa continuem sendo sumamente necessários, eles não excluem a importância de uma demonstração pública de apoio. Se a visita da presidente de uma das casas do Poder Legislativo norte-americano (e que é adversária de longa data do totalitarismo chinês) a Taiwan é a melhor maneira de fazer tal demonstração, é algo passível de discussão diante de tantos fatores envolvidos. E, ainda que esta visita específica não tenha sido a decisão mais prudente, há de se reconhecer que os Estados Unidos ao menos foram além de palavras de solidariedade e reforçaram a promessa, feita por Joe Biden, de apoiar Taiwan em caso de um ataque comunista.

Até o momento, a resposta da ditadura comunista foi parar de importar peixe e frutas da ilha – sem, no entanto, tocar no importante comércio de chips taiwaneses, fundamentais para as fábricas de eletrônicos chinesas – e realizar novos exercícios militares mais próximos da ilha, mas que até o momento soam mais como nova demonstração de força que como sinal de um ataque iminente. Apenas os próximos dias e semanas mostrarão se o recado norte-americano foi convenientemente entendido por Pequim.

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