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Foi agitada a semana que passou. Tivemos o encerramento da CPMI dos Correios com a aprovação de seu relatório final e, no mesmo dia, a emblemática absolvição do ex-presidente da Câmara, deputado João Paulo Cunha, por ampla maioria no plenário da Casa. Dois fatos que guardam entre si oceânica e frustrante contradição: de um lado, comprovava-se, entre centenas de outros delitos, a existência da prática criminosa do mensalão; de outro, preservava-se o mandato de um parlamentar notoriamente beneficiário da cornucópia escusa que abasteceu o mesmo mensalão.

Em outro plano, aprofundavam-se as investigações em torno da violação do sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa – o rapaz que desmascarou as seguidas afirmações do ex-todo-poderoso e respeitado ministro da Fazenda, Antônio Palocci, de que não freqüentava a alegre mansão brasiliense onde se faziam traficâncias com recursos públicos. E confirmava-se que o crime foi praticado com a participação, com o conhecimento ou com a anuência dos mais altos escalões da República.

Chegou-se, deste modo, a mais um marco da vida recente do país do qual se devem esperar repercussões futuras. Desde maio do ano passado, quando o ex-deputado Roberto Jefferson fez suas primeiras denúncias, inúmeros cadáveres foram descobertos à beira do caminho. Alguns poucos foram devidamente enterrados sob o manto da legislação punitiva, mas a maioria ainda jaz insepulta, protegida pelo corporativismo, pelo jogo político ou pela leniência das investigações. A tarefa, portanto, está até agora incompleta.

Já se podem contar, contudo, pelo menos dois resultados definitivos dessa aflitiva ebulição a que a política e a sociedade foram submetidas. O primeiro resultado é decepcionante, pois restou evidente não se ter produzido o suficiente para acabar com o mal terrível da impunidade que impera no país. Conseqüentemente, cresceu mais ainda a crise de confiança da sociedade na classe política, nos governos, nas instituições e na democracia – aliás, como prova o silencioso, mas crescente movimento em favor do voto nulo nas próximas eleições. Outro resultado foi a debilitação do Partido dos Trabalhadores – e do governo que patrocina – como paradigma da ética e, portanto, como representativo de larga parcela da sociedade que apostou ser ele capaz de promover a restauração da moralidade.

Dessa forma, está formado o cenário sob o qual se desenrolará a campanha eleitoral que se aproxima. O pano de fundo é a desilusão generalizada e o enterro, ainda que provisório, da tendência brasileira de construir e acreditar em mitos salvadores. Reconheça-se: é grande ainda o carisma do atual presidente, candidato à reeleição, e suas chances de manter-se no cargo são até agora maiores do que as dos adversários. Mas não é imbatível – e a campanha que virá, certamente recheada pela maximização das mazelas que marcaram seu mandato, poderá convencer o eleitorado a procurar caminho diferente, buscando substituir o excesso de discurso grandiloqüente pela simples eficiência gerencial.

O eleitorado brasileiro é que, no final, vai exercer seu poder de justiça em razão das lições que recebeu ao longo da dolorosa via-sacra que percorreu nos últimos meses.

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