Os veículos de comunicação podem sim, em nome do interesse público, divulgar informações e documentos que cheguem ao seu conhecimento

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Em mais um episódio do que já pode ser considerado um dos mais lamentáveis equívocos da Justiça brasileira em relação à liberdade de imprensa, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF) decidiu na semana passada manter decisão de julho de 2009 que impede o jornal O Estado de S. Paulo de publicar notícias sobre a Operação Boi Barrica, realizada pela Polícia Federal. A operação, depois rebatizada de Faktor, levou ao indiciamento de Fernando Sarney, filho do ex-presidente do Senado, José Sarney, por lavagem de dinheiro, tráfico de influência, formação de quadrilha e falsidade ideológica. Após a publicação do acórdão da decisão, o jornal deverá recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Em 2009, atendendo a pedido dos advogados do próprio Fernando Sarney, o desembargador do TJ-DF, Dácio Vieira – conhecido amigo da família Sarney e por isso considerado suspeito para julgar o caso – decidiu impedir o jornal paulista de divulgar qualquer informação referente à operação da PF. O argumento, que se manteve na decisão da última semana, seria de que o jornal não poderia veicular reportagens sobre o caso porque a investigação é sigilosa e que em uma decisão anterior, do Superior Tribunal de Justiça (STJ) as provas da investigação foram consideradas ilícitas.

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O problema é que uma análise mais atenta mostra que os argumentos usados na decisão são questionáveis. Primeiro, cabe à Justiça e não à imprensa a garantia de sigilo. Se os órgãos e pessoas responsáveis pelas investigações divulgam mais do que deveriam, a imprensa não pode ser punida. E mesmo em casos de inquéritos ou processos judiciais que corram sob segredo de justiça, o entendimento consagrado é o de que os veículos de comunicação podem sim, em nome do interesse público, divulgar informações e documentos que cheguem ao seu conhecimento, exatamente o que fez O Estado de S. Paulo no caso em tela. Se não fosse assim, como a imprensa poderia cumprir um de seus importantes papéis que é o de fiscalizar o poder público?

Também se deve lembrar que o valioso direito à intimidade pode ceder espaço em situações em que o interesse público seja muito grande. Eis o que diz o artigo 93 da Constituição: "Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação".

Nunca é demais lembrar que em um Estado Democrático de Direito, os meios de comunicação têm o dever de levar à sociedade informações relevantes e de interesse de todos, principalmente aquelas que se revelem lesivas ao bem comum. Infelizmente, a decisão dos desembargadores do Distrito Federal revela que ainda há muito a ser feito para que tal dever possa ser cumprido a contento. Certamente os veículos de comunicação podem e devem responder por eventuais abusos e a Justiça pode decidir legitimamente por restringir a divulgação de certas informações, mas para tanto há de se apoiar na análise e ponderação equilibrada dos direitos envolvidos. O que é certo, porém, é que em alguns casos específicos, como é o da Operação Boi Barrica/Faktor, colocar interesses individuais acima de tudo é prejudicar o bem comum.