• Carregando...

Nas últimas semanas, autoridades econômicas, com o ministro Guido Mantega à frente, se desmancharam em elogios ao trabalho feito por eles mesmos na economia nacional. O motivo para tamanha euforia e disposição para o autoelogio foi o anúncio de que o risco Brasil aplicado a títulos financeiros ficou abaixo do risco Estados Unidos. Olhando o indicador internacional de maneira superficial pode-se ter a impressão de que a aplicação de dinheiro na compra de papéis brasileiros é menos arriscada do que a aplicação em títulos norte-americanos.

Aproveitando a conclusão superficial, o ministro da Fazenda disse em alto e bom som que o Brasil desfruta de posição nunca antes imaginada, por força e obra da gestão econômica petista. É perfeitamente possível listar indicadores positivos sobre a economia brasileira, alguns deles até melhores do que indicadores similares dos Estados Unidos. Não há como negar o bom desempenho do Brasil em vários aspectos de sua economia, alguns dos quais vêm desde que a inflação foi debelada, em 1994, por Fernando Henrique Cardoso, e que o governo do PT, de forma positiva, deu continuação.

Embora Lula tenha passado seus dois mandatos se recusando a reconhecer os êxitos de FHC, a presidente Dilma Rousseff fez questão de deixar claros os pontos bem-sucedidos da política econômica anterior, sobretudo o lançamento das bases para que Lula pudesse fazer boa gestão macroeconômica. A atitude elevada da presidente foi anotada em carta aberta enviada a Fernando Henrique por ocasião da comemoração dos 80 anos de idade do ex-presidente. Assim como eram falsas algumas das críticas de Lula ao seu antecessor, também são parcialmente falsos os atuais elogios megalomaníacos sobre o Brasil, particularmente na comparação com os Estados Unidos.

Tanto Fernando Henrique como Lula cometeram erros sérios como legaram êxitos incontestáveis, e o país avançou nos dois governos. Todavia, é falso acreditar que o Brasil se tornou menos arriscado para os investidores em relação aos Estados Unidos apenas porque foi anunciado um risco Brasil inferior ao risco norte-americano. Trata-se de uso indevido de uma informação verdadeira. O índice referido, no qual o Brasil aparece melhor, refere-se ao indicador de risco nas aplicações de títulos financeiros de curto prazo, inferiores a 12 meses. Nesses, o Brasil surge em melhor posição do que os Estados Unidos no radar dos investidores internacionais. Entretanto, quando se consideram os títulos de longo prazo, pelo menos cinco anos, o risco Brasil é o dobro do risco norte-americano.

A taxa de risco de prazo curto leva em consideração circunstâncias momentâneas da economia dos países. No caso dos Estados Unidos, os investidores fizeram uma parada na compra de ativos financeiros daquele país em face de problemas atuais, alguns políticos, outros econômicos. Por um lado, há dúvidas quanto ao comportamento do Congresso Nacional dos EUA em relação ao orçamento e ao endividamento do tesouro público. Por outro, há indefinições em relação ao rumo da campanha pela reeleição de Obama e quanto a leis não totalmente resolvidas, como é o caso do seguro-saúde.

É ingenuidade acreditar que um país cuja moeda não é conversível no mercado internacional, como é o caso do real brasileiro, pode apresentar risco para os investidores em ativos financeiros inferior ao risco de comprar títulos do país cuja moeda é o padrão internacional. Todo detentor de títulos do governo dos Estados Unidos sabe que pode vendê-los em qualquer parte do mundo e receber os dólares equivalentes, o que não se aplica à moeda brasileira. Ainda que seja uma notícia propícia para arroubos de grandiosidade, o fato é que a taxa menor do risco Brasil não deriva de méritos brasileiros superiores aos méritos dos Estados Unidos. Deriva de uma situação de curto prazo e passageira, tanto que, para aplicações de longo prazo, o risco Brasil é, no mínimo, o dobro do risco norte-americano.

Analisando mais fundo a questão do bom indicador brasileiro, vale fazer alguns alertas. O excessivo volume de reservas internacionais do Brasil, que é um dos pilares do baixo risco país, é resultado da maciça entrada de dólares para aplicação em ativos financeiros de curto prazo, que pagam juros mais altos do que os internacionais. Não é dinheiro que vem para fincar bases na implantação de empresas e novos negócios permanentes. Somente por esse aspecto, o sucesso anunciado pelo ministro da Fazenda tem boa dose de fragilidade, pois não é garantia de êxito sólido de prazo longo.

Outra fragilidade da situação externa brasileira é a baixa taxa de câmbio que, caso persista em prazo muito longo, pode impor reduções expressivas nas exportações e gerar piora nas contas do balanço de pagamentos. Portanto, ainda que seja uma boa notícia, o baixo risco atribuído ao Brasil não é um atestado de alta solidez.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]