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Hoje, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado deve analisar, em uma sessão extraordinária marcada para às 9 horas, o texto do PLS 236/2012, que pretende dar ao Brasil um novo Código Penal. Iniciativa do senador José Sarney (PMDB-AP), quando presidia a Casa, o texto original foi redigido por uma comissão de juristas nomeada pelo Senado. O resultado foi tão ruim que um grande nome do direito brasileiro, Miguel Reale Júnior, o chamou de "obscenidade" que "não tem conserto". Sarney fez o que pôde para acelerar a tramitação do Código Penal, mas suas intenções foram barradas por outros parlamentares, que acertadamente exigiam mais tempo para refletir sobre o longo texto. Inúmeras emendas depois, chegou-se a uma versão que podia até não ser a ideal, mas já se distanciava bem dos absurdos inicialmente propostos. No entanto, ao longo da tramitação, alguns itens preocupantes foram reincorporados ao projeto.

Se podíamos identificar um eixo condutor na proposta assinada pela comissão de juristas, era o politicamente correto. A vida humana foi relativizada ao ponto de a pena para deixar de socorrer crianças, inválidos ou feridos ser menor que a pena para quem deixasse de socorrer ou abandonasse animais (respectivamente, 1 a 6 meses de prisão contra 1 a 4 anos de prisão). O aborto, na prática, estaria liberado até a 12.ª semana de gestação. O plantio, a compra e o porte de drogas seriam liberados para uso próprio – apesar da contradição de punir o vendedor de entorpecentes. E o texto ainda previa outras aberrações, como uma "justificação social" para o terrorismo. Era isso que Sarney queria ver aprovado o quanto antes.

Felizmente, os senadores, especialmente Pedro Taques (PDT-MT), relator do PLS 236/2012 na comissão especial criada para analisar o Código, apresentaram emendas que restabeleceram o bom senso em várias dessas situações. Em relação às drogas, o texto manteria o que a Lei de Drogas prevê atualmente, com advertência, prestação de serviços à comunidade e medidas educativas para quem compra, planta ou guarda entorpecentes em casa. Houve um esforço para hierarquizar as penas, voltando a colocar a pessoa humana em primeiro lugar. A legalização do aborto até a 12.ª semana de gestação foi rejeitada; no relatório de Taques, não se puniria a interrupção de gravidez resultante de estupro, quando não há outro meio de salvar a vida da mãe, ou "se comprovada a anencefalia ou quando o feto padecer de graves e incuráveis anomalias que inviabilizem a vida extrauterina, em ambos os casos atestado por dois médicos". O caso de anencefalia segue entendimento do STF, mas a menção a "graves e incuráveis anomalias" foi uma novidade introduzida pela comissão de juristas, infelizmente mantida por Taques.

Encerrado o trabalho da comissão especial, o PLS 236 foi para a CCJ, agora com Vital do Rêgo (PMDB-PB) como relator. Lá, o texto sofreu novas alterações, algumas delas preocupantes. O plantio, a compra e o porte de drogas para uso próprio voltaram a ser legalizados, sem nenhuma punição, nem mesmo advertências ou medidas educativas (estas penas seriam aplicadas apenas em caso de uso ostensivo de drogas em locais públicos ou na presença de crianças e adolescentes). Um permissivismo perigoso, se tivermos em conta o mal que as drogas causam aos usuários e suas famílias.

É especialmente absurdo e inaceitável que o relatório de Vital do Rêgo tenha colocado de volta no Código Penal o texto segundo o qual "não constitui crime de terrorismo a conduta individual ou coletiva de pessoas movidas por propósitos sociais ou reivindicatórios, desde que os objetivos e meios sejam compatíveis e adequados à sua finalidade". Essa ressalva, que havia sido removida do relatório de Taques, mas retornou agora, é praticamente uma legitimação da ideia de que os fins justificam os meios, uma validação do terrorismo – que, lembremo-nos, quase sempre se apresenta como meio "necessário" para se atingir uma causa nobre. E, se a avaliação da "nobreza" da causa ficar sujeita ao arbítrio ou à ideologia de quem vai julgar os atos de terror, podemos chegar ao ponto de haver um "passe livre" para o terrorismo.

Se o Código Penal passar pela CCJ com esses trechos aberrantes, é imprescindível que, ao continuar sua tramitação no Senado (e, depois, na Câmara), os parlamentares busquem removê-los, guiados pela busca de uma sociedade justa, baseada no respeito à dignidade humana.

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