Tinha vindo em boa hora o anúncio feito no início da semana passada pelo presidente interino Michel Temer, que prometeu paralisar indicações para diretorias e presidências de fundos de pensão e estatais até que dois projetos que alteram regras para nomeações fossem aprovados na Câmara dos Deputados. O objetivo seria adotar um critério mais técnico e menos político. A intenção é ótima: a história recente tem demonstrado que essas indicações de cunho político-partidário geram graves consequências, como a incompetência administrativa dos apaniguados, que assumem cargos para os quais não possuem a menor preparação, e os reiterados escândalos de corrupção.

CARREGANDO :)

Ambos os textos já aprovados no Senado combatem o aparelhamento político – um mal que, nos governos do PT e seus aliados, levou ao desastre financeiro de fundos e estatais. Um dos projetos impede ministros, secretários estaduais e municipais de ocuparem postos nos conselhos de administração das estatais, além de estabelecer exigências de experiência prévia para esses cargos. Na madrugada desta quarta-feira, a Câmara aprovou o projeto, mas com alterações que permitem a nomeação de dirigentes partidários – por isso, o projeto voltará ao Senado. A segunda proposta trata dos conselhos de fundos de pensão e, entre outras vedações, proíbe que sejam indicadas pessoas que tenham exercido atividades político-partidárias nos dois anos anteriores à nomeação. Este projeto deve ser votado na Câmara na próxima semana.

A história recente tem demonstrado que indicações de cunho político-partidário geram graves consequências

Publicidade

As propostas podem até não acabar definitivamente com o aparelhamento político; afinal, sempre que uma norma é criada para combater a corrupção, dá-se um jeitinho de contornar os obstáculos e inovar nos procedimentos de desvio de recursos públicos – basta observar as tentativas de amenizar as restrições sugeridas. Mas elas certamente dificultariam a farra da partilha de cargos e minimizariam os efeitos nocivos do fisiologismo político. Esquemas como o da Petrobras, descoberto na Operação Lava Jato, teriam dificuldades adicionais para serem postos em prática.

O escândalo que envolve a estatal do petróleo é atualmente o maior símbolo dos malefícios do aparelhamento político, mas não é o único, nem o primeiro. Os Correios ainda hoje sofrem os efeitos do mensalão, operando com déficit e precisando de um empréstimo para pagar salários e honrar débitos com fornecedores. Para se ter uma ideia do tamanho do problema da empresa, o prejuízo estimado no ano passado foi de R$ 2,1 bilhões e as perdas de 2016, até o mês passado, atingem cerca de R$ 700 milhões.

Outro caso de corrupção ou incompetência administrativa ocorre na gestão do fundo de pensão dos funcionários da Caixa, o Funcef. Com um déficit de R$ 2,3 bilhões em 2014 e um rombo estimado em R$ 5 bilhões no ano passado, o fundo precisa agora de aportes adicionais de seus participantes. Essa cobrança deve, em princípio, ocorrer por 17 anos. A suspeita de corrupção levou ao indiciamento de 145 pessoas ligadas ao Funcef na CPI dos Fundos de Pensão encerrada neste ano. São exemplos como esses que demonstram como o Brasil padece com a cultura da troca de cargos em estatais para satisfazer ambições partidárias – algo que permeia todo o sistema nativo de presidencialismo de coalizão.

Mas, mesmo antes que a Câmara desfigurasse o projeto sobre as estatais, a esperança de que o governo dificultasse as indicações políticas para cargos-chave já estava naufragando. Três dias após fazer seu anúncio moralizador, o próprio Temer colocou no comando dos Correios o ex-deputado Guilherme Campos Júnior, presidente interino do PSD, aquela legenda criada por Gilberto Kassab (hoje ministro das Comunicações) para apoiar Dilma e que não é “nem de esquerda, nem de direita, nem de centro”, na definição de seu inventor. Geddel Vieira Lima, ministro da Secretaria de Governo, tentou justificar dizendo que “não dava para mudar mais” porque o acerto já tinha sido feito. Uma desculpa pífia para a perpetuação de um dos grandes males da política nacional. Mais uma vez, a prática desmente o discurso.

Publicidade