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O que torna a situação mais preocupante é imaginar que, para cada caso de tortura denunciado, possa haver outros tantos que seguem encobertos

As reviravoltas na investigação do assassinato da adolescente Tayná Adriane da Silva, 14 anos, deixam à mostra o que há de melhor e de pior dentro das polícias. A denúncia de que os quatro suspeitos presos dias depois do crime teriam sido torturados para confessar o estupro e a morte da garota precisa ser investigada com todo o rigor. Se as acusações forem confirmadas, podemos dizer que estamos diante de uma situação tão grave quanto o próprio homicídio da jovem Tayná: uma corporação que tem entre seus membros pessoas que perderam o senso de limite quando se trata de desvendar um crime, recorrendo a práticas degradantes.

Tayná desapareceu em 25 de junho, perto de um parque de diversões em Colombo (Região Metropolitana de Curitiba). Dois dias depois, quatro suspeitos foram presos e confessaram o crime. O corpo de Tayná foi encontrado no dia 28. Desde então, a investigação passou a andar em círculos: o inquérito da Polícia Civil afirmava que os quatro suspeitos violentaram e estrangularam Tayná, mas o exame de DNA mostrou que o sêmen encontrado na roupa da adolescente não era de nenhum deles. No último dia 12, o Ministério Público afirmou que havia indícios suficientes para ligar os suspeitos ao crime, mas dois dias depois o promotor Paulo Lima pediu que o grupo fosse solto.

Nesse ínterim, os suspeitos disseram a representantes da OAB que confessaram sob tortura, que teria incluído pau de arara e empalamento. Na segunda-feira, o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) e a Corregedoria da Polícia Civil pediram à Justiça a prisão de 15 pessoas que estariam envolvidas nas torturas. O Centro de Operações Policiais Especiais (Cope), unidade de elite da Polícia Civil, também está sendo investigado. A resposta rápida das autoridades merece elogios, mas não podemos parar aí.

Como é possível que uma força policial que tem como objetivo proteger o cidadão possa usar de métodos tão vis como aqueles que, a julgar pelo depoimento dos suspeitos, teriam sido usados contra eles? Ainda que os quatro homens sejam efetivamente culpados, não há absolutamente nada que justifique a tortura. Recorrer a ela é responder a uma barbárie com outra barbárie. Essa prática, digna dos piores totalitarismos, é um flagrante e injustificável desrespeito aos direitos humanos.

O que torna a situação mais preocupante é imaginar que, para cada caso de tortura denunciado, possa haver outros tantos que seguem encobertos. Aqueles que são responsáveis pelas forças policiais precisam investigar não apenas a denúncia do caso Tayná, mas também se o caso é isolado ou se é a ponta do iceberg de uma "cultura da tortura" entranhada nas polícias paranaenses.

É justo que a comunidade espere que os culpados pela morte de Tayná sejam encontrados e devidamente punidos – sabemos que, quanto mais tempo se passa, mais difícil se torna a solução do crime. No entanto, se a mera pressa em dar uma resposta à sociedade já pode levar a erros, pior ainda é quando a essa pressa se soma a prática da tortura. Nesse sentido, é preciso elogiar o trabalho desenvolvido pela Polícia Científica, que não entrou no frenesi que pedia uma solução rápida para a morte de Tayná e pode, inclusive, ser a chave para incriminar policiais, caso as denúncias de tortura se mostrem verdadeiras. O turbilhão de emoções causado tanto pelo assassinato quanto pelo suposto tratamento degradante dado aos suspeitos deixa evidente que não há como julgar toda uma corporação pelo comportamento das maçãs podres – mas também é preciso descobrir em que grau essas maçãs estão contaminando parcelas maiores da polícia.

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