• Carregando...
dinheiro a receber
Tripé macroeconômico adotado no governo FHC foi abandonado e trocado pela “nova matriz econômica” no governo Dilma.| Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo

Desde o sucesso do Plano Real, implantado em julho de 1994, com o qual o Brasil conseguiu vencer a inflação crônica que havia anos vinha impedindo crescimento econômico e desenvolvimento social seguro e contínuo, tornou-se uma espécie de consenso que, qualquer que seja o governante eleito, a política econômica deve ter um eixo estrutural básico estável. Um dado eixo foi escolhido, planejado e implantado no governo Fernando Henrique Cardoso e tinha por base um tripé: austeridade fiscal, metas de inflação e câmbio flutuante. Embora existam outras opções de política econômica, é necessário que o eixo estrutural escolhido tenha bases sólidas e seja mantido por tempo suficiente para apresentar resultados, sem o que não é possível avaliar suas qualidades e eventuais defeitos.

A economia de um país carrega as bases estruturais de sua realidade, aquilo que é o esqueleto da economia nacional, e sofre as influências das situações e eventos conjunturais, aqueles que acontecem em determinados momentos e mudam com o tempo, mas que interferem fortemente no desempenho produtivo e no desenvolvimento social. Como elementos estruturais, o Brasil tem seus recursos naturais – extenso território, condições para uma rica agropecuária, abundantes fontes de água doce, amplas reservas minerais, biodiversidade única etc. –, uma realidade urbana composta de 5.570 municípios, dos quais 80% têm menos de 50 mil habitantes, as vias de transporte rodoviário e ferroviário, o sistema portuário aéreo e marítimo, e um sistema estatal consolidado. Essa realidade está dada e é sobre ela que a política econômica deve trabalhar.

A estrutura econômica brasileira – que tem outros componentes além dos citados – é de expansão lenta e relativamente difícil, e é considerando essa realidade que a política econômica deve escolher as intervenções onerosas (as que exigem recursos financeiros para sua execução, como é o caso dos investimentos em infraestrutura física) e as intervenções não onerosas (que não exigem dinheiro, pois são regras de comportamento e ação diária, como leis que criam monopólios, velocidade máxima em rodovias etc.). Praticamente não há discordância quanto aos objetivos socioeconômicos principais, que são o crescimento econômico, a geração de empregos, a superação da pobreza, o aumento da renda por habitante e, por consequência, a melhoria do padrão de vida de toda a população.

A gestão da política não comporta invencionices nem ideias mirabolantes, principalmente ameaças de ruir as bases da economia livre de mercado e o ambiente institucional favorável ao empreendedorismo e aos negócios

A cada eleição presidencial, os concorrentes sempre prometem fazer o país crescer e melhorar as condições de vida de todos e, em linhas gerais, praticamente todos prometem política econômica boa, sólida e conducente à prosperidade material, ainda que divirjam sobre os caminhos que prometem trilhar para atingir os objetivos. Há certo consenso no meio político de que o controle da inflação, o equilíbrio das contas públicas e os resultados positivos nas contas externas são elementos necessários para a saúde econômica do país e para criar um clima favorável ao investimento privado nacional e estrangeiro.

Quando Lula foi eleito presidente, em 2002, havia dúvida razoável sobre como ele iria gerenciar a economia, já que o discurso radical do PT, desde a criação do partido, era baseado em certo ódio ao capitalismo, amor ao socialismo e forte inclinação ao aumento do tamanho do setor estatal. Percebendo que a imagem de seu partido era de certo radicalismo anticapitalista, Lula divulgou durante a campanha a “Carta aos Brasileiros”, na qual prometia respeitar as bases de uma economia saudável, sem radicalismos nem aventuras socialistas. Uma vez eleito, seu governo foi beneficiado por uma conjunção de fatores – como a ausência de crise internacional, expansão das exportações de commodities e aumento dos preços dos produtos brasileiros exportados – e, apesar do escândalo do mensalão, surgido em 2005, o primeiro governo de Lula terminou com bom índice de aprovação, devido à boa situação das contas externas, controle das contas públicas e da inflação, e crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) que, sem ser extraordinário, foi bom.

Qualquer governo que consiga sucesso em algumas áreas e algumas políticas públicas não colhe êxito e popularidade caso se saia mal nas cinco áreas essenciais: situação fiscal, contas externas, inflação, crescimento e emprego. O mérito de Lula foi o de, no primeiro mandato, ter apoiado as autoridades econômicas no trato com responsabilidade da política fiscal, da política monetária e da política cambial, seguindo as bases montadas no governo Fernando Henrique Cardoso, e não ter cedido às pressões de alas do seu partido para “mudar tudo que aí está”. Quanto à boa situação das contas do país com o resto do mundo e o aumento das reservas internacionais, isso foi possível graças à elevação nas receitas de exportação causadas pelo aumento constante dos preços internacionais das commodities exportadas pelo Brasil.

A tentação gastadora, no entanto, revelou-se mais forte no fim do segundo mandato de Lula, que lançou as bases da “nova matriz econômica” aplicada com toda a força por sua sucessora, Dilma Rousseff. Os maus resultados colhidos em seu governo deveram-se, em boa parte, à reversão da boa situação internacional, à ampliação de gastos com o funcionalismo estatal deixada como legado por Lula (derivada de generosos reajustes salariais e aumento do quadro de servidores), além, é óbvio, dos enormes erros cometidos por Dilma e Guido Mantega – ministro da Fazenda entre 2006 e 2014 –, especialmente o abandono do tripé macroeconômico que vinha desde FHC. A brutal recessão dos anos 2015 e 2016 resultou da retração internacional, dos erros de Dilma e da baixa taxa de investimentos, especialmente em infraestrutura física. Os baixos investimentos sempre foram a marca do Brasil, permaneceram assim no governo de Lula e Dilma, e tornaram-se um dos maiores entraves ao crescimento da economia e da melhoria social.

A questão essencial é que somente uma política econômica com bases sólidas, reconhecidas e que se mantêm estáveis por anos seguidos é capaz de fornecer as condições para a expansão dos investimentos estatais, criar um ambiente favorável ao aumento dos investimentos privados e fazer o Produto Interno Bruto (PIB) crescer continuamente de forma a elevar a renda por habitante, conseguir baixas taxas de desemprego, reduzir a pobreza e melhorar o bem-estar social. A gestão da política não comporta invencionices nem ideias mirabolantes, principalmente ameaças de ruir as bases da economia livre de mercado e o ambiente institucional favorável ao empreendedorismo e aos negócios.

O mundo está cheio de exemplos de países, alguns bem próximos do Brasil, que empobreceram por culpa de governos hostis ao capitalismo, à propriedade privada e ao empreendedorismo. Se a economia piora todos os anos, ninguém consegue impedir o aumento do desemprego e da pobreza, o agravamento dos problemas sociais e o empobrecimento geral, mesmo que o país seja rico de recursos naturais. A economia não é uma ciência exata, mas cobra um alto preço das nações que agridem sua lógica e aplicam experimentos heterodoxos que nunca deram certo em nenhum país.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]