• Carregando...

Em qualquer lugar do mundo onde existe o instituto da reeleição, os governantes em busca de novo mandato evitam baixar medidas que, embora necessárias, sejam eleitoralmente polêmicas. Portanto, é praticamente certo que a presidente Dilma Rousseff não tomará medidas duras no campo da economia nos próximos quatro meses, ainda que dificilmente o país escape de ter de fazer correções de rumo em 2015. Há vários furos na economia brasileira carentes de solução capaz de levar à recuperação do crescimento econômico.

É sempre simplista atribuir apenas ao governante de plantão o bom desempenho econômico, como também é simplismo culpar exclusivamente o governo pelos problemas. A presidente Dilma já está sofrendo o efeito invertido da mania de seu partido em atribuir à suposta genialidade de Lula o bom desempenho do Brasil nas contas externas até 2008. Os adversários de Dilma dirão que se o governo do PT foi o arauto do êxito, esse mesmo governo é também culpado pelos graves problemas que estão afetando o balanço de pagamentos. Nem uma coisa nem outra. Nem Lula foi o gênio responsável pelos bons ventos das contas externas (ainda que méritos possam ser apontados) nem Dilma é culpada sozinha pelos problemas atuais (ainda que erros venham ocorrendo).

Ao acumular reservas cambiais em total superior à dívida externa brasileira, Lula tratou de espalhar aos quatro ventos que seu governo salvou o Brasil da falência. Essa conquista somente foi possível porque Lula se beneficiou de quatro eventos positivos, dois deles herdados de FHC (o controle da inflação e a desvalorização cambial), um deles vindo do mercado internacional (a elevação surpreendente dos preços das exportações brasileiras, sobretudo em função do aumento do consumo na China) e o quarto resultante do mérito do Banco Central em seu governo (o respeito às regras cambiais e à política de abertura ao exterior).

A presidente Dilma não teve a mesma sorte. O quadro internacional mudou, a crise financeira dos Estados Unidos em 2007/2008 travou o fluxo de capitais, a crise europeia disseminou pânico nos mercados e a China reduziu seu crescimento e as importações. Com seus déficits constantes, é grave a situação atual do balanço de pagamentos. O saldo de transações correntes (exportações menos importações de bens e serviços), que foi superavitário em cinco dos oito anos do mandato de Lula, vem se deteriorando aceleradamente. O déficit nesse quesito, conforme dados do Banco Central foi US$ 28,2 bilhões em 2008, R$ 24,3 bilhões em 2009, R$ 47,3 bilhões em 2010 (ano da eleição de Dilma) e, a partir daí, não cessou de crescer: R$ 52,5 bilhões em 2011, R$ 54,3 bilhões em 2012 e, no ano passado, atingiu a cifra de R$ 81,4 bilhões. Segundo alguns especialistas, se nada for feito, em poucos anos o Brasil terá de financiar déficit em transações correntes da ordem de US$ 100 bilhões/ano.

Quando um país apresenta déficits em suas relações com o exterior, há somente duas formas de pagar a conta: tomar empréstimos em dólar no mercado internacional (o que eleva a dívida externa) ou receber dólares do resto mundo para investimentos diretos (construção de empresas) ou para aplicações em ativos financeiros nacionais. Mas o mundo não se dispõe a financiar eternamente um país com déficit em suas relações com outros países, sobretudo quando esse país, apesar de suas vantagens, apresenta problemas internos capazes de desestimular os investidores estrangeiros, como é o caso do Brasil.

É assustador o silêncio dos políticos, especialmente dos parlamentares aportados no Congresso Nacional, a respeito do balanço de pagamentos, quando os problemas nessa área podem ser o divisor de águas entre o sucesso e o fracasso. A situação não é, no momento, desesperadora. O problema está na tendência que os números mostram. Com o déficit em transações correntes caminhando para os US$ 100 bilhões/ano, as reservas internacionais de R$ 370 bilhões podem desaparecer rapidamente e, com elas, sumirão os investidores estrangeiros receosos de que a deterioração da situação externa possa criar uma crise de graves proporções.

Examinando os números do balanço de pagamentos dos últimos anos e tendo em conta as expectativas para os anos seguintes, não há como descartar a hipótese de que uma crise esteja em andamento nessa área da economia brasileira.

Dê sua opinião

Você concorda com o editorial? Deixe seu comentário e participe do debate.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]