Nesta semana, a "reforma eleitoral", consubstanciada no Projeto de Lei da Câ­­mara (PLC) n.º 141/2009, poderá ser votada no Senado Federal. Trata-se de uma reforma, principalmente, confusa. Uma grande colcha de retalhos

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Os pontos positivos continuam sendo, por exemplo, as regras que tratam do exercício de direito de resposta em caso de ofensas veiculadas pela internet; as alterações que passam a permitir a propaganda eleitoral por meio de mensagem eletrônica, e também por meio de blogs, redes sociais, sítios de mensagens instantâneas e assemelhados, desde que gerados ou editados por candidato, partido político, coligação ou pessoas físicas; a liberação de doações pela internet e por telefone, realizadas por pessoas físicas; e a ampliação, de três para seis meses antes das eleições, do período em que é vedada a participação de candidatos em inaugurações de obras públicas.

Apesar disso, os equívocos e as incongruências ainda se mostram muito mais numerosos.

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O projeto, por exemplo, pretende admitir a doação, por pessoas físicas, que passe de 10% dos rendimentos brutos aferidos no ano anterior à eleição, observado apenas um limite de R$ 50 mil. Uma permissão que, ao que tudo indica, poderá dar ensejo a fraudes e a tantas outras práticas indesejadas. Em quanto tempo surgirão os primeiros casos de pessoas cujas doações representarão 80%, 90% ou até 100% dos seus rendimentos brutos? É evidente, portanto, que o novo modelo em nada contribui para o aprimoramento do sistema eleitoral, mas sim para a sua burla.

Um outro aspecto diz respeito à propaganda paga na internet. Os senadores sinalizaram com a possibilidade de flexibilização da regra proibitiva, o que também é bastante discutível. Pela evidente dificuldade de fiscalização, a proibição de qualquer espécie de propaganda paga na internet – à exceção da reprodução dos jornais impressos – se revela muito mais salutar.

Ainda, um outro tema que merece especial atenção é o atinente à sucessão nas hipóteses de cassação no âmbito do Poder Executivo. Se a cassação ocorrer antes da primeira metade do mandato, a proposta prevê a realização de nova eleição. Já, se a cassação ocorrer a partir da segunda metade do mandato, pretende-se que o novo representante seja escolhido pelo Poder Legislativo. Ora, ainda que se sustente a existência de um paralelo na Constituição Federal – hipótese de vacância dos cargos de presidente e vice-presidente da República –, a solução não parece ser a mais adequada. Mesmo nos casos de cassação ocorrida nos dois últimos anos do mandato, preferível é a realização de nova eleição ou a posse do segundo colocado.

Por fim, vale destacar que sobre várias matérias o suspense permanece. E a principal delas diz respeito à manifestação da expressão e da liberdade de opinião pela rede mundial de computadores.

Por motivos estranhos à razão, muitos dos nossos representantes em Brasília ainda parecem querer contrariar o óbvio. Insistem na regra de que os conteúdos próprios das empresas de comunicação social e dos provedores de internet devem observar as normas relativas às emissoras de rádio e de televisão.

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Não compreendem que tais emissoras se sujeitam a diversas limitações por uma razão bastante clara e direta: são permissionárias (FMs) e concessionárias (televisões e AMs) de serviço público. Daí a vedação à difusão de opinião favorável ou contrária a candidatos, partidos políticos ou coligações; a vedação a qualquer forma de propaganda eleitoral paga; e assim por diante. São proibições às quais não se sujeitam, por exemplo, jornais e revistas, que se caracterizam como veículos de livre circulação e que independem, portanto, de autorização governamental. Não conseguem perceber que a internet é ainda muito mais democrática e flexível do que um jornal ou do que uma revista. Não conseguem perceber que a realidade e que o regime jurídico aplicável à internet em nada se assemelham com a realidade e com o regime jurídico aplicável às emissoras de rádio e de televisão.

Assim, é absolutamente incerto o resultado final da mais recente "reforma eleitoral" em trâmite no Congresso Nacional.

A única certeza é a de que questões realmente relevantes e necessárias para o aprimoramento da nossa democracia – tais como o fim do voto obrigatório e a adoção do voto distrital misto com lista aberta –, foram, mais uma vez, deixadas de lado.