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| Foto: André Rodrigues/Gazeta do Povo

A desconfiança em relação às urnas eletrônicas apareceu logo depois da eleição presidencial de 2014. Em geral, escrutínios apertados como aquele tendem por si só a causar desconfiança de adulteração na contagem de votos (a candidata Dilma Rousseff ganhou pela estreita margem de 3,28% dos votos válidos), entretanto dois outros fatores contribuíram para aumentar a suspeita sobre o sistema de votação: a insatisfação crescente da população contra os diversos escândalos de corrupção durante os governos petistas; e a decisão do então presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Dias Toffoli, de realizar a totalização dos votos em sala fechada contando apenas com a ajuda dos técnicos do TSE – fato que não deveria ter sido aceitado tão passivamente, sobretudo pelas pessoas e entidades diretamente envolvidas no pleito. 

O candidato perdedor, o tucano Aécio Neves, reconheceu o resultado das eleições e parabenizou Dilma Rousseff logo após a apuração, mas pouco tempo depois o PSDB entrou com uma ação no TSE, reclamando auditoria nas urnas. O inquérito apontou que não houve fraudes, embora um documento do partido apontasse que o resultado não era “conclusivo” e que o sistema de voto eletrônico “não permite a plena auditagem”.

É impossível garantir 100% de inviolabilidade em um mundo no qual hackers conseguem invadir os sistemas mais seguros do planeta

Quatro anos depois, entremeados pelos escândalos deflagrados pela Operação Lava Jato, gigantescos protestos de rua contra o governo, um impeachment presidencial, diversas prisões de figurões da política nacional e a insatisfação popular em relação a diversos habeas corpus concedidos a eles pelos ministros do STF, o povo retornou às urnas para mais uma eleição majoritária. Mas as questões mal resolvidas de 2014, tal qual uma neurose coletiva que projeta no presente os problemas do passado, reapareceram já no primeiro turno das eleições de 2018: e as urnas eletrônicas, mais uma vez, foram fortemente questionadas.

Apesar da decisão do STF que declarou inconstitucional a lei do voto impresso, que tinha sido aprovado pelo Congresso e seria implantado em uma parcela das urnas (o que serviria para uma futura e possível auditoria) e das reclamações de algumas irregularidades divulgadas na internet no primeiro turno, as urnas eletrônicas nunca foram tão fiscalizadas e demonstraram resultados tão precisos como nos resultados do primeiro turno das eleições. 

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Leia também: Urnas eletrônicas e o fim da democracia (artigo de Dante Mantovani, publicado em 18 de outubro de 2018)

Isso significa que o sistema de votação eletrônica está à prova de falhas e fraudes? É impossível fazer esse tipo de afirmação em um mundo no qual hackers conseguem invadir mesmo os sistemas mais seguros do planeta, como o do Pentágono. O que a Justiça Eleitoral pode fazer é trabalhar ao máximo para reduzir as oportunidades de fraude. Existem alguns fatores que dificultam a operação de um esquema de grandes proporções, como o fato de as urnas ficarem desconectadas durante o pleito, e no caso específico de 2018 podemos listar outros elementos em favor da confiabilidade do atual sistema de votação, sobretudo no segundo turno. Vários tribunais regionais pediram auditoria das urnas em que houve algum indício de fraude ou mau funcionamento, registrado devidamente em boletim de ocorrência; foi permitida a presença de fiscais de partido nos locais de apuração e totalização dos votos, o que não havia ocorrido em 2014; e, apesar de todo o alvoroço, as previsões dos institutos de pesquisa foram confirmadas com os resultados das eleições, inclusive em relação à margem de vitória do candidato do PSL, Jair Bolsonaro.

Com o fim deste processo eleitoral, é bem provável que a população se esqueça das urnas e os ânimos se acalmem. Entretanto, apesar de muito questionado, o sistema tem se demonstrado confiável. A Justiça Eleitoral também fez um esforço maior para se mostrar exemplar e solícita às demandas por transparência nas presentes eleições. Mesmo assim, não se pode ignorar que o voto eletrônico pode e deve ser aprimorado, visando uma eleição ainda mais transparente e que seja capaz de dirimir as dúvidas da população em disputas mais acirradas. Um sistema que permita recontagem de votos, como a utilização de cédulas ou impressão do voto, auditorias externas, unificação do horário da eleição em todo o território nacional e maior transparência na hora da totalização dos votos fortaleceriam ainda mais nossa democracia. O sistema ainda pode e deve ser aperfeiçoado, mas já é hora de boatos deixarem de causar tanta inquietação pública.

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