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O governo federal parece ter consciência do que precisa ser feito na área de infraestrutura e logística, mas ainda não sabe a melhor maneira de fazê-lo

O aguardado pacote de investimentos para tentar reverter a tendência de crescimento fraco do PIB foi anunciado ontem pelo governo federal. Ao longo de 30 anos, serão investidos R$ 133 bilhões, com mais da metade desse valor previsto para os primeiros cinco anos. Por meio de concessões, o setor privado duplicará 7,5 mil quilômetros de rodovias e construirá 10 mil quilômetros de ferrovias. Na situação atual do país, todo investimento em infraestrutura e logística é necessário; ainda mais louvável é a destinação da maior parte do valor do pacote à malha ferroviária, o que tem o poder de reduzir, no médio prazo, o "custo Brasil" que eleva desnecessariamente os preços de commodities e alimentos. No entanto, detalhes do plano anunciado ontem dão uma série de motivos de preocupação em relação ao sucesso da iniciativa.

A própria presidente Dilma Rousseff, buscando contentar os petistas e demais aliados mais ideológicos e menos pragmáticos, se apressou em dizer que, na verdade, não se trata de privatização. Deixando de lado a discussão bizantina sobre privatização ou concessão, o fato é que o pacote equivale a um reconhecimento, por parte do governo, de que o Estado brasileiro é incapaz de administrar de forma competente as malhas rodoviária e ferroviária, precisando, assim, que a iniciativa privada venha em seu socorro. E nisso tem toda a razão. Mas existe uma profunda contradição em criar uma estatal para controlar o processo; há um grande risco de que a nova Empresa de Planejamento e Logística (EPL) não passe de mais um enorme cabide de empregos destinado a apadrinhados políticos, pois o organograma do Poder Executivo já tem órgãos que poderiam muito bem gerenciar as novas concessões. Além disso, a necessidade atual de corte de gastos governamentais aconselharia justamente o contrário do que faz o governo com a criação de mais uma empresa estatal.

Infelizmente, por melhores que sejam as intenções do governo com o novo pacote de investimentos, o histórico dos anos Lula e Dilma no setor de transporte é desfavorável. Vale a pena lembrar a novela do trem-bala que ligará São Paulo ao Rio de Janeiro, uma demonstração da ineficiência governamental em lidar com a questão, chegando ao ponto de o leilão de julho de 2011 (realizado após dois adiamentos) não ter atraído nenhum interessado.

Já o último grande pacote de concessões de rodovias, licitado em 2007, tem poucos resultados para mostrar, lembrou ontem o jornal Folha de S.Paulo. Eram oito grandes projetos, no valor de R$ 945 milhões e que deveriam estar prontos até o início de 2013. Hoje, já se sabe que nenhum deles cumprirá o prazo – cinco obras nem começaram – e, até fevereiro deste ano, só R$ 100 milhões haviam sido efetivamente investidos. Segundo avaliações de mercado, as empresas que venceram as licitações de 2007 ofereceram pedágios baixos demais e, por isso, não teriam como concluir as obras. Se o diagnóstico for correto, temos todos os motivos para temer uma repetição do cenário, pois o critério anunciado hoje pelo governo é, novamente, a menor tarifa – a única novidade é uma exigência de entregar as obras até 2018.

Outra ocasião em que ficou claro o despreparo governamental ao lidar com as concessões no setor do transporte foi o leilão dos aeroportos de Guarulhos, Viracopos (em Campinas, no interior de São Paulo) e Brasília. As regras da licitação acabaram espantando as operadoras responsáveis por grandes e importantes terminais europeus, e os vencedores incluíram empresas de currículo apenas mediano e, no caso de Brasília, com um histórico de calotes em credores. Tudo isso demonstra que o governo federal parece ter consciência do que precisa ser feito, mas ainda não sabe a melhor maneira de fazê-lo. Cada concessão atrapalhada, em vez de promover o crescimento de que o Brasil necessita, traz o risco de piorar os gargalos logísticos em um momento no qual o país não pode se dar ao luxo de admitir novos erros. Por isso, é imprescindível que o governo Dilma demonstre ter aprendido com os equívocos passados e, nesta nova rodada de investimentos, encontre meios de garantir que os concessionários efetivamente realizem as obras no prazo, com qualidade e sem desperdícios.

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