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Oksana Jadvizak, paranaense de Prudentópolis, que participou dos protestos de estudantes na Ucrânia em 2014.
Oksana Jadvizak, paranaense de Prudentópolis, que participou dos protestos de estudantes na Ucrânia em 2014.| Foto: Oksana Jadvizak / Arquivo pessoa

A brasileira Oksana Jadvizak, 35 anos, presenciou pessoalmente há oito anos o início do acirramento entre Ucrânia e Rússia que culminou na invasão militar comandada por Vladimir Putin na última quinta-feira (24).

Paranaense de Prudentópolis, cidade de 52,7 mil habitantes a 200 km de Curitiba, ela faz parte do 75% da população do município que é de origem ucraniana. Entre 2008 e 2014, Oksana morou na cidade de Lviv, onde recebeu bolsa do governo da Ucrânia para fazer a graduação e mestrado em história. Período também em que participou dos protestos contra o governo pró-Rússia da Ucrânia, os quais depuseram o então presidente Viktor Yanukovych, aliado de Putin, ao custo de cerca de cem mortos pela repressão brutal da polícia, inclusive um professor de Oksana.

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"Não tem como a gente não chorar vendo o que está acontecendo na Ucrânia. O que eu vi foi duro. Mas isso agora é bem diferente, muito pior do que eu vivenciei. É guerra, com tanques se movimentando e atirando, aviões bombardeando as cidades. Tudo muito diferente de 2014", compara a descendente de ucranianos, que chegou a perder um professor, morto pela polícia, nos protestos.

Fluente na língua ucraniana desde criança - só aprendeu português aos 7 anos ao ir para a escola -, Oksana participou dos protestos de estudantes que derrubaram Viktor Yanukovych, cuja política era alinhada a de Putin. Em fevereiro de 2013, atos a favor da democracia e contra a corrupção passaram a levar milhares de ucranianos às ruas. A decisão de Yanukovich na sequência de não assinar acordo de cooperação com a União Europeia inflamou ainda mais os manifestantes.

Praça da Independência em Kiev após a repressão violenta da polícia aos estudantes em 2014.
Praça da Independência em Kiev após a repressão violenta da polícia aos estudantes em 2014.| Oksana Jadvizak / Arquivo pessoa

A aproximação com o bloco europeu seria o principal passo da Ucrânia para ingressar na Organização do Atlântico Norte (Otan), aliança militar que inclui potências da Europa, como Alemanha, França e Reino Unido, e é comandada pelos Estados Unidos. A proximidade da Otan com o território russo é o ponto que mais irrita o presidente Putin, sob a alegação de que a Rússia ficaria exposta a possíveis ataques do Ocidente. Motivo que levou Moscou a atacar a Ucrânia novamente oito anos após a Rússia anexar a península da Crimeia em resposta à queda de Yanukovych.

"O presidente da época estreitou laços com a Rússia e isso deixou a população ucraniana insatisfeita. Aí começou toda a confusão, com os estudantes indo para as ruas", explica Oksana, que participou ativamente dos protestos em 2013 e 2014, chamados de Euromaidan - junção das palavras Europa e Maidan, que significa independência em ucraniano, nome também da praça em Kiev epicentro das manifestações.

"Fui com um grupo de estudantes de Lviv para Kiev, onde me voluntariei para ajudar os manifestantes. Eu levava comida para pessoas feridas nos hospitais improvisados em prédios públicos", recorda a hoje servidora da Secretaria Municipal de Turismo de Prudentópolis, cidade nos Campos Gerais perto de Ponta Grossa, conhecida não só pelas igrejas e arquitetura de estilo ucraniano, mas também por suas cachoeiras.

A resposta violenta do governo aos manifestantes da Praça da Independência foi decisivo para que o presidente Yanukovych fosse deposto. Cerca de cem de pessoas morreram e milhares ficaram feridas ao serem alvejadas pela polícia ao longo dos protestos. Entre eles, um professor de Oksana.

"Participei dos protestos contra a orientação da Embaixada Brasileira na época, que temia pela nossa segurança. Decidi participar porque sei do sofrimento do povo ucraniano com o domínio russo", afirma Oksana, que agora volta a ver o país de onde veio sua família sufocado pela Rússia mais uma vez. "Em 2014 tinha atiradores espalhados por todos os lados, até tanques nas ruas, mas não em movimento. Inclusive perdi um professor nessa reação brutal", lamenta a moradora de Prudentópolis.

Após 93 dias em que o governo tentou reprimir os protestos com violência, uma junta pluripartidária tomou o poder da Ucrânia. Em fevereiro de 2014, Yanukovych se asilou na Rússia e foram convocadas novas eleições, vencidas pelo empresário Petro Poroshenko, político pró-ocidente. Na eleição de 2019, Poroshenko foi sucedido pelo atual mandatário ucraniano, o humorista Volodymyr Zelenski, eleito com um discurso de renovação e anticorrupção.

Ucraniana presta homenagem aos mortos vítimas da polícia nos protestos de estudantes em Kiev em 2014
Ucraniana presta homenagem aos mortos vítimas da polícia nos protestos de estudantes em Kiev em 2014| Oksana Jadvizak / Arquivo pessoa

A resposta de Putin à queda do aliado Yanukovich não ficou barata. No mês seguinte, em março de 2014, as tropas de Moscou invadiram a Ucrânia e anexaram a península da Crimeia, que passou a fazer parte do território da Rússia. Após a anexação, grupos de origem russa de outros dois territórios, Donetsk e Lugansk, reforçaram suas atividades separatistas na fronteira com a Rússia, no oeste da Ucrânia. O que culminou na invasão de quinta-feira, sob a alegação de que a população de origem russa desses dois territórios estava sendo ameaçada pelo governo de Kiev.

Ajuda aos refugiados

Mesmo agora distante da Ucrânia, Oksana não se viu impedida de ajudar os ucranianos que tentam fugir da invasão russa. Em especial os amigos que fez nos oito anos em que viveu em Lviv. A servidora pública é uma das moradoras de Prudentópolis que ofereceu a própria casa para receber refugiados.

"O povo de Prudentópolis é muito acolhedor. Eu falei para meus amigos de lá virem para cá. Eles agradeceram, mas disseram que vão ficar e lutar pela Ucrânia", afirma Oksana. A servidora municipal foi quem traduziu o ofício enviado pela prefeitura de Prudentópolis oferecendo abrigo aos moradores de Ternóbil, cidade-irmã do município paranaense, de cuja região veio a maioria dos imigrantes que vivem no Brasil.

"Nós, descendentes, não vamos deixar os ucranianos desamparados. É o mínimo que podemos fazer pelo país de onde vieram nossos antepassados", afirma Oksana, que é da quarta geração da família Jadvizak no Brasil.

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