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Prédio histórico da UFPR, no Centro de Curitiba.
Prédio histórico da UFPR, no Centro de Curitiba.| Foto: Henry Milleo/Arquivo/Gazeta do Povo

A retificação da lista de aprovados da Universidade Federal do Paraná (UFPR) na última terça-feira (31) suscitou questionamentos e críticas em relação ao vestibular da instituição centenária. Advogados e um professor ouvidos pela Gazeta do Povo, por exemplo, apontaram falta de transparência no processo de correção que levou à retirada de 31 nomes que haviam sido divulgados como tendo sido aprovados no Vestibular 2020/2021, e citam até a possibilidade de indenização por danos morais aos alunos que se sentiram prejudicados.

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Sérgio Garcia Júnior, coordenador do curso preparatório Dynâmico, disse à reportagem que dois de seus alunos estão nos extremos opostos dessa situação. O nome de um deles estava na lista divulgada na terça-feira (31), e depois foi retirado do rol de aprovados. Outra estudante não figurava na primeira divulgação, mas teve o nome confirmado depois da retificação. Ambos foram procurados pela Gazeta do Povo, mas não quiseram dar entrevistas. A instituição também se manifestou apenas por seus canais oficiais.

“Ter o nome divulgado na lista de aprovados de um vestibular, ainda mais da Federal. gera uma expectativa muito grande não só no estudante, mas em toda a família. E, para quem foi retirado dessa lista, o impacto é muito grande”, avaliou Sérgio. “Já não bastasse a pandemia, que está deixando todo mundo de uma certa forma abalado, ainda há essa situação. O estudante fica recolhido dentro de casa há mais de um ano, consegue se preparar, faz a prova, confere o nome na lista e vê que passou e que conseguiu entrar na universidade. Aí vem um banho de água fria desse, não consigo imaginar o que isso fez na cabeça desses jovens”, completou.

O coordenador cita um caso anterior, ocorrido em 2002, quando houve uma situação similar à deste vestibular. Na ocasião, disse Garcia Júnior, a UFPR acabou por incorporar às turmas os estudantes que tiveram seus nomes divulgados inicialmente na lista de aprovados. Para ele, esta seria a medida mais adequada a ser tomada agora.

“Uma solução possível seria integrar esses alunos, nem que fosse metade deles agora e metade no próximo vestibular, no ano que vem. Isso seria o mais justo, eles poderiam abrir, por exemplo, 10 novas vagas para Medicina agora e 11 no vestibular do ano que vem e abater essas vagas no próximo processo seletivo como forma de equacionar o problema. Para Medicina pode até ser mais complicado, porque foram 21 casos em Curitiba e quatro em Toledo. Mas para os outros cursos é uma, no máximo duas vagas, como foi em Direito. Abrir esse processo de recurso justamente na prova de produção de textos é uma atitude muito questionável, e isso certamente vai acabar em muitos processos na Justiça”, ponderou.

Quebra da boa-fé

A avaliação é a mesma da advogada Vívian Martins Sgarbi, do escritório LSB Advogados Associados. De acordo com ela e os outros advogados do escritório, a partir do momento em que o candidato faz a inscrição no vestibular tem-se o início de uma relação baseada na boa-fé com a instituição. E essa relação, sugere Sgarbi, pode ter sido quebrada com a retificação da lista de aprovados.

“O candidato acredita no que ele viu, na aprovação, e vai conferir e depositar todo seu futuro nisso. Então, o candidato pode inclusive pedir a posse da vaga nesse caso. Isso deveria ter sido averiguado antes da divulgação. Se houve erro, não foi da parte do candidato. A falha da UFPR não é justificável e viola a boa-fé objetiva, atingindo diretamente os direitos da personalidade dos vestibulandos”, explicou.

Não há uma resposta única para todos os 31 casos, pontuou a advogada, que defende um candidato prejudicado pela suspensão do concurso da Polícia Civil em fevereiro de 2021 - também organizado pela UFPR. Mas, segundo ela, os candidatos que se sentirem prejudicados no vestibular podem tanto pleitear por uma indenização por danos morais quanto demandar a vaga inicialmente informada na primeira lista de aprovados.

“É possível se exigir transparência da Universidade quanto à correção das provas por meio de um Mandado de Segurança, que é o mecanismo jurídico para se cobrar um direito líquido e certo, quando constatado que o candidato possuía pontuação suficiente para ser aprovado”, disse Sgarbi.

Erro de processamento

Em nota publicada em seu site, o Núcleo de Concursos da UFPR informou que a “retificação foi necessária em virtude de uma falha ocorrida no processamento dos resultados, que fez com que deixassem de ser computados os ajustes nas notas de produção de texto decorrentes de recursos interpostos por candidatos e que, após a análise por parte da Banca Examinadora, foram deferidos”.

Entre os dias 9 e 11 de agosto a UFPR abriu a possibilidade de recursos quanto às notas da prova de redação. A universidade não informou quantos pedidos de revisão de notas foram feitos pelos candidatos, mas afirmou na nota que 467 destes recursos foram deferidos. Uma falha no processamento dessas novas notas fez com que a lista dos aprovados fosse divulgada sem as novas notas de quem teve o recurso aceito.

O planejamento original da UFPR era divulgar a lista de aprovados só em 9 de setembro, mas a data foi antecipada para o fim de agosto. Questionada pela reportagem sobre se essa antecipação poderia ter impactado sobre a divulgação equivocada da lista de aprovados, a instituição respondeu, em nota, que “não há qualquer relação entre a antecipação da divulgação do resultado e o erro de processamento”. O texto reforça ainda que “o erro decorreu de uma falha pontual de processamento, e não de qualquer problema no sistema”.

Em um vídeo divulgado pela UFPR, o diretor do Núcleo de Concursos da universidade, Alexandre Trovon, deu mais detalhes sobre o ocorrido.

“Por conta da situação de pandemia, este ano a UFPR realizou o processo seletivo em fase única. Questões objetivas e produção de texto ocorreram no mesmo dia. Isso exigiu ajustes técnicos no sistema de processamento das notas. Lamentavelmente, nesse processo ocorreu uma falha pontual que levou à retificação da lista de aprovados. Esta situação envolveu 467 candidatos que apresentaram recursos relativos à nota da redação, e tiveram esses recursos acatados pela banca examinadora. Mas, com esse erro de processamento, as notas pós-recurso não foram computadas", contou.

"O erro foi percebido pelo Núcleo de Concursos logo após a divulgação da lista de aprovados na última terça-feira. Nós então mobilizamos uma equipe para analisar a situação e buscar uma solução. Lamentavelmente, se percebeu que 31 candidatos deixaram de integrar a lista de aprovados. O Núcleo de Concursos lamenta e se solidariza com esses 31 candidatos. Mas não havia outra alternativa senão efetuar a correção das notas respeitando os outros 31 candidatos que deveriam ter sido aprovados. Lembramos aos candidatos que fiquem atentos às chamadas complementares que serão divulgadas nas próximas semanas, certamente com vagas na maioria dos cursos da universidade. Inclusive nesses que tiveram a lista de aprovados retificada”, disse Trovon.

A UFPR determinou a instalação de Comissão de Sindicância para apurar todos os fatos e eventuais responsabilidades pela nova falha. O prazo para o processo de envio de documentos para o registro acadêmico se estenderá até as 23h59min do dia 08/09/2021. As informações sobre o desempenho individual dos candidatos também já estão disponíveis no site oficial do NC/UFPR.

Não é a primeira vez que o Núcleo de Concursos da UFPR cria polêmica em provas e processos seletivos. Em 21 de fevereiro deste ano o Núcleo de Concursos da UFPR acabou suspendendo, horas antes da prova, o concurso da Polícia Civil do Paraná. Milhares de pessoas, muitas vindas de várias regiões do país, só ficaram sabendo do cancelamento momentos antes da realização da prova. Na época, a justificativa foi falta de segurança sanitária, devido à pandemia, para dar sequência ao concurso. A UFPR acabou multada em mais de R$ 1 milhão.

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